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O que a condenação de canadense à morte na China mostra sobre crise diplomática entre os países

Robert Lloyd Schellenberg foi inicialmente condenado a 15 anos de prisão, mas, na segunda, um tribunal decidiu aplicar a pena de morte - AFP/Getty Images
Robert Lloyd Schellenberg foi inicialmente condenado a 15 anos de prisão, mas, na segunda, um tribunal decidiu aplicar a pena de morte Imagem: AFP/Getty Images

15/01/2019 10h28

Para especialistas em relações internacionais, a escolha pela pena capital seria uma forma de retaliar o Canadá pela prisão da executiva da Huawei Meng Wenzhou.

Um tribunal da China sentenciou um canadense à pena de morte por tráfico de drogas, numa decisão que agrava o conflito diplomático entre os dois países.

Robert Lloyd Schellenberg havia sido condenado a 15 anos de prisão em novembro de 2018. Agora, um tribunal de segunda instância considerou a decisão muito "leniente" e optou pela pena capital.

Mas a radical mudança de posicionamento está sendo vista como uma possível retaliação diplomática.

A decisão ocorre poucas semanas após o Canadá prender, a pedido dos Estados Unidos, a executiva Meng Wanzhou, uma das dirigentes da gigante de tecnologia chinesa Huawei.

"Causa grande preocupação a nós como governo, assim como deve ser para todos os nossos amigos e aliados internacionais, que a China tenha escolhido aplicar de forma arbitrária a pena de morte, como no caso do canadense", reagiu o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau.

O governo canadense também mudou os conselhos destinados a cidadãos do país com viagem prevista para a China, pedindo que atuem com "alto grau de cuidado" quando estiverem no território do país asiático.

Já a China respondeu com irritação às críticas de Trudeau. O ministro de Relações Exteriores chinês disse que estava "altamente insatisfeito" com os comentários do premiê e que os canadenses "precisam respeitar a soberania da China".

Caso Schellenberg

O canadense de 36 anos sentenciado à morte foi preso em 2014, acusado de planejar o contrabando de 227 kg de metanfetamina da China para a Austrália.

Schellenberg foi condenado a 15 anos de prisão em novembro, mas um tribunal de segunda instância na cidade de Dalian trocou a sentença para a pena de morte na segunda (14).

"Eu não sou um traficante de drogas. Eu vim à China como turista", disse Schellenberg, segundo a agência de notícias AFP, pouco antes da sentença ser anunciada. A tia do canadense, Lauri Nelson-Jones, disse que a pena de morte era "uma situação horrorosa, infeliz e de partir o coração".

"É a confirmação do nosso maior medo. É impossível imaginar o que ele deve estar sentindo e pensando", afirmou.

Acredita-se que a China execute mais pessoas por ano que qualquer outro país, mas os números são mantidos em sigilo.

O grupo de defesa dos direitos humanos Anistia Internacional afirma que milhares de pessoas são executadas a cada ano - mais do que os números de execuções em todos os países somados.

Vários estrangeiros já foram executados por crimes relacionados a drogas no passado, entre os quais o britânico Akmal Shaikh, executado em 2009 apesar das alegações de que ele tinha problemas mentais e do apelo por clemência feito pelo primeiro-ministro do Reino Unido.

Diplomacia de pressão

A condenação à morte de Schellenberg é vista com suspeita por analistas internacionais já que ocorre num momento em que a China está indignada com a prisão de Meng Wanzhou, 46 anos, filha do fundador da Huawei.

O caso deteriorou as relações da China com o Canadá e os Estados Unidos. Wanzhou foi liberada sob fiança em dezembro, mas permanece no Canadá sob constante vigilância e precisa usar uma tornozeleira eletrônica até que as autoridades do país decidam se atendem ao pedido do governo americano para que ela seja extraditada aos Estados Unidos.

A executiva chinesa é acusada pelos EUA de usar, entre 2009 e 2015, uma subsidiária da Huawei, a Skycom, para burlar sanções econômicas impostas ao Irã.

Ela nega. E a China acusa os o governo americano de usar a prisão como instrumento de pressão na guerra comercial travada entre o país asiático e os Estados Unidos.

Nas semanas subsequentes à prisão de Wanzhou, a China deteve dois cidadãos canadenses. O ex-diplomata Michael Kovrig e o empresário Michael Spavor foram acusados de ameaçarem a segurança nacional.

O governo chinês negou, também nesses dois casos, qualquer ligação com o caso de Meng Wanzhou, mas alguns especialistas em relações internacionais enxergam relação direta.

Donald Clarke, pesquisador em Direito chinês na George Washington University, nos Estados Unidos, diz que a pena de morte a Schellenberg é um "passo sem precedentes na diplomacia chinesa".

"Eu vi casos que considerei injustos antes, mas não me lembro de nenhum que parecesse tão desconectado assim da inocência ou culpa do acusado", disse Clarke ao serviço chinês da BBC.

Nos últimos dias, a China se esforçou para dar ao caso de Schellenberg prominência internacional. Numa atitude incomum, as autoridades chinesas convidaram jornalistas estrangeiros para assistir ao julgamento no tribunal, relatou o repórter da BBC John Sudworth.

Apesar da insistência do canadense em dizer que é inocente, o julgamento dele durou apenas um dia - e pena de morte foi anunciada menos de uma hora depois da conclusão dos depoimentos.

Um editorial publicado nesta terça (25) no jornal nacionalista chinês Global Times afirma que "a especulação desarrazoada" da imprensa ocidental ligando o caso à prisão de Meng Wenzhou demonstra "um desprezo desrespeitoso à lei chinesa".

"O julgamento também envia a mensagem de que a China não vai ceder à pressão externa na implementação das suas leis", afirma o jornal.

No entanto, em dezembro, o editor do Global Times alertou que a China "definitivamente adotaria medidas de retaliação ao Canadá" se Meng Wanzhou não fosse libertada.

"Se o Canadá extraditar Meng aos Estados Unidas, a vingança da China será muito pior que a prisão de um canadense", disse Hu Xijin num vídeo postado no site do Global Times.

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