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'Eles perderam o bonde da história', diz advogado hostilizado em protesto

O advogado Alexandre Simões de Mello, 33 - Márcio Neves/UOL
O advogado Alexandre Simões de Mello, 33 Imagem: Márcio Neves/UOL
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Guilherme Balza

Do UOL, em São Paulo

19/11/2014 13h39

O advogado Alexandre Simões de Mello, 33, não imaginava que as ofensas e agressões que sofreu durante protesto contra a presidente Dilma Rousseff (PT), realizado no sábado (15) em São Paulo, fossem provocar tanta repercussão. Ele foi hostilizado por manifestantes enquanto caminhava em direção à sua casa, na região da avenida Paulista, por vestir uma camiseta vermelha estampada com ícones do comunismo.

As agressões foram registradas em vídeo pela reportagem no UOL, que cobria o protesto, e viralizaram nas redes sociais. O advogado é xingado, empurrado e vaiado com direito a gritos “vai pra Cuba”. Enquanto concedia entrevista ao UOL, Mello foi interrompido por um homem que o mandou “arrumar emprego na Argentina ou na Venezuela”, entre outras coisas.

Apesar da repercussão, ele conta que não foi ameaçado ou hostilizado novamente. “Comigo não aconteceu nada, graças a Deus. Minha vida segue normal, só recebo demonstrações de apoio, no Facebook, mesmo no trabalho, que é um ambiente conservador, estou recebendo mensagens de apoio. Só recebi uma mensagem no Facebook de um estranho me acusando da receber verba da Petrobras”, afirma Mello, que trabalha em um escritório que trata de financiamento de projetos de infraestrutura.

Advogado fala sobre agressão em ato anti-Dilma na Paulista

“Não tenho medo, inclusive dei o meu nome. Sinceramente, não fiz absolutamente nada de errado, não tenho que esconder meu nome, quem escondeu o nome foram os agressores, que não quiserem se se identificar à reportagem do UOL. Eles são covardes. Quando agem em bandos, se sentem mais poderosos. Mas quando têm de se responsabilizar pelos seus atos, aí são covardes. Isso é bem sintomático”, diz.

Bonde da história

O protesto de sábado (15) foi o segundo realizado para pedir a anulação das eleições e o impeachment da presidente reeleita. No primeiro ato, ocorrido em 1º de novembro, parte dos manifestantes defendia abertamente a intervenção militar para tirar a petista do poder. No segundo protesto, a cena se repetiu, mas a defesa de um golpe rachou o movimento.

Parte dos manifestantes decidiu permanecer na avenida Paulista, onde o protesto começou; outra parcela dirigiu-se à praça da Sé; um terceiro grupo, formado por saudosos da ditadura militar, caminhou até o Comando Militar do Sudeste, que fica na região do Paraíso, perto do Parque do Ibirapuera.

Para o advogado, este tipo de manifestação, “de não aceitação da democracia, é pendular”. “Sempre que a democracia começa a se mostrar mais para o povo brasileiro, essas forças reacionárias reaparecem. Foi assim em 1964. Infelizmente essas forças estão querendo reaparecer. Eles perderam o bonde da história. É outro momento, outra conjuntura internacional, e se eles insistirem em continuar dessa maneira, vão ser barrados pela verdade e pela força do povo brasileiro. E pela informação. Hoje há a internet e outras formas de circulação da informação que não existiam em 64.”

Mello afirma que o desejo de intervenção militar não reflete o sentimento da maioria dos eleitores de Aécio Neves (PSDB), mas que é “generalizado entre as pessoas que saem às ruas para participar de movimentos pelo impeachment de Dilma.”

O advogado contesta a máxima de que a violência parte tanto dos críticos quanto dos apoiadores de Dilma. “Isso não é verdade. Só vi esse tipo de agressão, antes e depois das eleições, contra apoiadores da Dilma. Não foram ‘petralhas’ que bateram até em cadeirante”, disse.

Eleitor de Dilma, Mello participou do ato de campanha da petista no Tuca, na PUC (Pontifícia Universidade Católica), na reta final das eleições. “A via em frente à PUC estava completamente ‘petralhada’, e vários estudantes passavam com camiseta azul e com adesivo do Aécio e nada acontecia com essas pessoas. Ninguém xingou, não tacaram ovos, nada. Não se pode generalizar essa violência para diminuir a culpa daqueles que agridem.”

Camiseta da discórdia

Comercializada em diversas estamparias, a camiseta que Mello usava no protesto tinha ilustrações dos líderes comunistas Karl Marx, Vladimir Lênin, Mao Tse-Tung, Fidel Castro e Joseph Stálin em uma festa, com bebidas na mão e chapéus de aniversário.

Mais do que exaltação ao comunismo, trata-se de uma brincadeira com a expressão em inglês “Communist Party”, que, traduzida ao português, pode significar tanto “Partido Comunista” quanto “festa comunista”.

O advogado afirma que, durante o período em que fez mestrado em Londres, a camiseta despertava “empatia” dos colegas. “As pessoas tiravam fotos, perguntavam onde tinha comprado. Aqui querem me agredir.”

Mello diz ter feito o mestrado com o dinheiro que guardou do trabalho, “sem bolsa do governo”. “Ainda assim, apoio o Ciência Sem Fronteiras, o Prouni, o Bolsa Família e outros programas que busquem equalizar as diferenças.”

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