'Ainda Estou Aqui' é o primeiro brasileiro como melhor filme no Oscar?

"Ainda Estou Aqui" fez história ao ser indicado ao prêmio de melhor filme e melhor filme internacional no Oscar 2025, se tornando o primeiro longa brasileiro a conquistar indicação em ambas as categorias e faz a estreia do país na disputa de melhor filme. Fernanda Torres foi indicada a melhor atriz. Veja a lista completa de indicados.
Caso você seja um cinéfilo e conheça bem a história do cinema, pode estar se perguntando sobre "O Beijo da Mulher Aranha', filme de 1985. Dirigido por Hector Babenco (cineasta argentino que se radicou no Brasil e se naturalizou brasileiro) e com Sonia Braga no elenco, ele foi selecionado em 1986 para as categorias de melhor diretor, melhor ator (para William Hurt) e melhor roteiro adaptado. O filme é uma produção brasileira e norte-americana e falada majoritariamente em inglês.
A Splash, a crítica de cinema e votante do Globo de Ouro Barbara Demerov, explicou detalhes sobre o filme de Babenco. "'O Beijo da Mulher Aranha' não é uma produção inteiramente brasileira. É uma coprodução entre Estados Unidos e Brasil, além de ser falado na língua inglesa. O filme também não foi o pré-indicado do Brasil para o Oscar (ficou para 'A Hora da Estrela', que não emplacou a vaga) porque, na época, o longa de Babenco era considerado mais norte-americano que brasileiro."
Para Roberto Sadovski, colunista de Splash, o fato de "O Beijo da Mulher Aranha" não ter "gerência de produtores brasileiros" faz a diferença ao considerar o país de origem do longa.
'Ainda Estou Aqui' é um caso totalmente diferente: produção brasileira, com financiamento levantado também por algumas produtoras estrangeiras. Mas é escrito aqui, produzido aqui, dirigido aqui, com nossa história e nossa língua.
Roberto Sadovski, colunista de Splash
"Ainda Estou Aqui" conta com nomes franceses envolvidos em sua concepção, ao ter a produção da Arte France Cinéma. No entanto, diferente de "O Beijo da Mulher Aranha", seu elenco é totalmente brasileiro, ele é ambientado no Rio de Janeiro, durante a ditadura militar, e é falado em português.
Podemos afirmar que "Ainda Estou Aqui" é o primeiro filme brasileiro a ser indicado ao Oscar de melhor filme porque é o primeiro majoritariamente produzido pelo Brasil e falado em português.
Flávia Guerra, colunista de Splash
Outra produção indicada ao Oscar de melhor filme que conta com brasileiros nos créditos é "Me Chame pelo seu Nome". Longa teve produção do brasileiro Rodrigo Teixeira.
Vale dizer que "Ainda Estou Aqui" também é o primeiro filme da América do Sul a figurar na categoria de melhor filme.
Baseado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, publicado em 2015, "Ainda Estou Aqui" narra a história de Eunice Paiva, mãe do escritor. Vivida por Fernanda Torres, Eunice enfrenta a violência do regime militar depois da prisão e do desaparecimento do marido, o deputado cassado Rubens Paiva (Selton Mello), no início da década de 1970.
O Rotten Tomatoes, agregador online de avaliações de críticos estrangeiros sobre filmes em geral, concedeu o selo de "Fresh" ao filme, com uma aprovação de 94% da imprensa especializada.
'Ainda Estou Aqui' fez história e entra no jogo do Oscar de cabeça erguida com uma indicação inédita como melhor filme. É a consagração da força de uma história brasileira que reverbera em todo o mundo.
Roberto Sadovski, colunista de Splash
Os filmes que concorrem com "Ainda Estou Aqui" são: "Anora", "O Brutalista", "Um Completo Desconhecido", "Conclave", "Duna: Parte 2", "Emilia Pérez", "Nickel Boys", "A Substância" e "Wicked".
Oscar no domingo de Carnaval
A cerimônia do Oscar está marcada para o dia 2 de março. O evento será exibido no Brasil a partir das 21h pela TNT e pela Max.
Anúncio dos indicados foi adiado duas vezes. Originalmente, a lista seria divulgada no dia 17 de janeiro. Devido aos incêndios que afetaram Los Angeles, no entanto, o anúncio foi adiado para o dia 19 e, em seguida, para esta quinta-feira (23).
Quem foi Eunice Paiva?
Hoje conhecida como símbolo da luta contra a ditadura militar, Maria Lucrécia Eunice Facciolla Paiva nasceu em São Paulo em 1929. De família de origem italiana, estudou no Colégio Sion. Ávida leitora, foi amiga de grandes escritores, como Lygia Fagundes Telles, e passou em primeiro lugar na Universidade Mackenzie para o curso de letras.
Conheceu Rubens Paiva, seu futuro marido, em 1947. Eles se casaram em 1952 e tiveram cinco filhos.
Em 1962, Rubens Paiva se tornou deputado federal, e em 1964, depois do golpe militar, teve seus direitos políticos cassados. Entre 1964 e 1970, a família Paiva viveu um período de instabilidade e se estabeleceu eventualmente no Rio de Janeiro. No início de 1971, eles seriam vítimas da tragédia que lhes acompanharia para o resto da vida.
Em 20 de janeiro de 1971, Rubens Paiva foi levado pela polícia da casa em que vivia com a família no Leblon. Foi a última vez que ele foi visto.
No dia seguinte, Eunice também foi presa e permaneceu 12 dias nas dependências do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) sendo interrogada. Após sua libertação, passou a questionar o que havia ocorrido com seu marido - mas não obtinha nenhuma resposta.
Em diversas cartas ao presidente Emílio Garrastazu Médici e outras direcionadas a diferentes autoridades, Eunice exigiu a verdade sobre o paradeiro do marido. Os órgãos oficiais, quando forneciam alguma resposta, davam relatos diferentes: ou que ele havia sido sequestrado por desconhecidos ou que havia fugido para Cuba.
Eunice se tornou símbolo das campanhas pela abertura de arquivos sobre vítimas do regime. Ela lutou ao lado de nomes como a estilista Zuleika Angel Jones, a Zuzu Angel; de Crimeia de Almeida; Inês Etienne Romeu; Cecília Coimbra; entre outras mulheres.
Formou-se em direito depois da morte do marido e se tornou uma das principais forças de pressão que culminou com a promulgação da Lei 9.140/95, que reconhece como mortas as pessoas desaparecidas em razão de participação em atividades políticas durante a ditadura militar.
Foi apenas em 1996, após 25 anos de luta por verdade, que Eunice conseguiu que o Estado Brasileiro emitisse oficialmente o atestado de óbito de Rubens Paiva. A primeira prova objetiva de seu assassinato só foi encontrada 41 anos depois, em novembro de 2012, com uma ficha que confirmava sua entrada em uma unidade do DOI-Codi.
Eunice Paiva conviveu com Alzheimer por 14 anos e morreu em 13 de dezembro de 2018, em São Paulo, aos 86 anos.
*Com informações de Agência Estado
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