O planeta Terra existe até hoje por sorte? Modelo científico mostra que sim
Demorou três ou quatro bilhões de anos para o Homo sapiens aparecer na Terra. E, após esse período todo, o nosso planeta permanece estável e com condições para nossa vida. Mas quão sortudos somos?
Toby Tyrrell, professor de ciência sistêmica da Terra, na Universidade de Southampton (Inglaterra), explorou a questão por meio de modelagem computacional. Usando um programa, ele criou 100 mil planetas fictícios e simulou a evolução do clima em cada um deles. O estudo completo foi publicado na revista Nature, em 2020.
Alguns processos podem acelerar ou diminuir mudanças climáticas, incluindo o efeito estufa e o derretimento de calotas polares. Gelo reflete a luz solar, enquanto água a absorve, causando ainda mais aquecimento e derretimento. É o que temos vivido por aqui.
Para investigar as chances de diferentes planetas continuarem habitáveis através das enormes escalas geológicas de tempo, o professor realizou 100 simulações em cada um deles. A cada vez, o local iniciava com uma temperatura diferente, e era exposto a aleatórios eventos alteradores de clima, como erupções de vulcões e impactos de asteroides.
O planeta era monitorado até ficar quente demais, frio demais ou conseguir sobreviver por 3 bilhões de anos —tempo em que seria possível o surgimento de vida inteligente.
O resultado? Apenas um dos 100 mil planetas digitais conseguiu responder tão bem aos acontecimentos e eventos climáticos que permaneceu habitável em todas as 100 simulações.
A maioria dos outros planetas que sobreviveu a alguma das simulações conseguiu fazer isso em menos de dez de todos os seus cenários. E, em quase todas as ocasiões que um local ficou habitável por pelo menos 3 bilhões de anos, foi por pura e simples sorte.
Se um asteroide que atingiu a Terra tivesse sido maior, ou se explosões solares tivessem sido mais fortes, nós provavelmente não estaríamos aqui na Terra.
Mas sorte não é suficiente. Planetas que foram especialmente programados para não dar nenhuma resposta aos acontecimentos nunca ficaram habitáveis. Ou seja: é muita sorte, mas também precisa de habilidade —e a Terra tem esses mecanismos reguladores.
O misterioso "termostato" da Terra
Cálculos dizem que, em alguns milhões de anos, nosso clima terá se deteriorado tanto que a Terra pode virar uma bola de gelo ou de fogo —há controvérsias sobre nosso destino apocalíptico.
Também sabemos que o Sol está 30% mais brilhante desde o surgimento da vida. Na teoria, isso significa ou que toda água do planeta estaria congelada há 3 bilhões de anos (o que não é verdade), ou que nossos oceanos teriam evaporado até agora (o que também não procede). Este é o "paradoxo do jovem Sol fraco", levantado por Carl Sagan e Mullen George na década de 1970.
Cientistas desenvolveram duas principais teorias para responder a esse mistério. A primeira é que a Terra tem algum tipo de termostato: um ou mais mecanismos de resposta —ainda não desvendados— que evitam que o clima se desvie a temperaturas fatais.
A segunda é que, entre tantos planetas, alguns simplesmente dão sorte. Essa hipótese tem se tornado mais plausível com as descobertas e a exploração espacial das últimas décadas. Observações astronômicas de estrelas distantes e de exoplanetas (fora do Sistema Solar) nos mostram que há outros locais no universo com terrenos e temperaturas adequadas para a vida.
De acordo com estudos recentes, pode haver pelo menos 300 milhões de planetas como a Terra, potencialmente habitáveis, apenas na Via Láctea. Mas são tão distantes, que nunca conseguiremos chegar lá para descobrir se também foram sortudos.
*Com reportagem de janeiro de 2021.