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OPINIÃO

Majestosa, Lauryn Hill entrega show intenso e coroa história da Chic Show

A cantora Lauryn Hill durante show em São Paulo, no sábado (13) - Van Campos/AgNews
A cantora Lauryn Hill durante show em São Paulo, no sábado (13) Imagem: Van Campos/AgNews
do UOL

Camilo Rocha

Colaboração para Splash, em São Paulo

14/07/2024 13h30

"Não é só um baile black", gritou Criolo durante o terceiro show do festival Chic Show 50 Anos, no sábado (12). O rapper do Grajaú frisou que a festa que deu nome ao evento era um fenômeno que ia muito além da dança e do entretenimento. Por décadas, a Chic Show foi um lugar de afirmação, construção de identidade e formação cultural para milhares de jovens negros.

O tom do festival que lotou o Allianz Parque, na Zona Oeste de São Paulo, foi de celebração da Chic Show e da música preta como fontes de inspiração e transformação pessoal.

Mano Brown, penúltimo show da noite, lembrou que Luizão, fundador da Chic Show, "virou a chave para os afrodescendentes de São Paulo". Atração principal da noite, Lauryn Hill fez referência à música de Stevie Wonder e Aretha Franklin como pilares da sua formação.

A primeira apresentação do evento ficou a cargo da veterana Sandra de Sá, que subiu ao palco antes das 13h30. O público ainda ocupava uma pequena fração da pista e das cadeiras, mas acompanhou atento e empolgado o show, cantando os refrões de músicas consagradas como "Retratos e Canções" (que Sandra chamou de "Melô da Masturbação") e "Olhos Coloridos". Com a voz em forma, Sandra soube prender a plateia em formação.

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Sandra de Sá abre o festival Chic Show 50 Anos de Black Music, neste sábado (13), em São Paulo
Imagem: Van Campos/AgNews

Rael entrou depois cativando o público com um show ágil e diverso, que juntou diversas pontas de referências musicais negras, indo do seu hino "Hip Hop É Foda" a uma versão de Bob Marley e a uma cover de Chic ("Le Freak") para homenagear o evento. A apoteose do show vem com uma releitura de "Lucro", do BaianaSystem, que faz o público pular alto. E ainda eram 15h30.

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O rapper Rael no festival Chic Show 50 Anos de Black Music, no sábado (13), em São Paulo
Imagem: Van Campos/AgNews

O próximo show fica a cargo de Criolo. A entrada é forte, com percussão vigorosa e clima intenso. A seu modo, o rapper exalta a história da Chic Show ao mesclar um show com composições suas, como "Convoque seu Buda" e o clássico "Não Existe Amor em SP", e intervenções do DJ DanDan.

É assim que entram na apresentação hits de baile como "Bam Bam" (Sister Nancy), onde Criolo pede que a plateia faça passinhos, como era o costume nos bailes da Chic Show, e "Loving You" (Minnie Ripperton). O show conclui em clima de roda de samba.

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O festival Chic Show 50 Anos teve show de Criolo
Imagem: Van Campos/AgNews

Vale destacar também as performances dos DJs da Chic Show (destaques para DJ Luciano e Grandmaster Ney) entre cada apresentação. Diferentemente de muitos festivais que inserem DJs de modo um tanto aleatório, o público do Allianz recebeu discotecários em sintonia total com o evento, exibindo seleções de sucessos da festa e interagindo com a plateia no microfone.

O americano Jimmy "Bo" Horne, veterano do funk e da disco, entrou com banda afiada e o repertório de muitos clássicos das pistas de dança da Chic Show (ele mesmo se apresentou na festa na década de 1980).

Músicas como "You Get Me Hot" e "Dance Across the Floor", além de pérolas da KC & The Sunshine Band (KC compôs vários hits de Horne) bateram em cheio entre os frequentadores 40+, uma fatia expressiva do público do festival. Apesar da voz de Horne não atingir todas as notas de antes e os arranjos dos hits trazerem mudanças, o show animou um estádio já completamente tomado.

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Jimmy 'Bo' Horne 'abraça' o público que esteve presente no festival Chic Show, no sábado (13), em São Paulo
Imagem: Van Campos/AgNews

É em clima de noite de gala que Mano Brown desponta no palco do festival. De terno xadrez azul, o rapper dos Racionais ocupa o palco acompanhado de sua banda Boogie Naipe. Ao som de grooves redondos inspirados no funk dos anos 1970, Brown é um maestro no comando de um baile de dezenas de milhares.

O artista mescla raps e exclamações vocais, deixando que o cantor Lino Krizz se encarregue dos vocais ao estilo soul music. Dançarinos ajudam a compor o show. Brown conta para a plateia que está ali realizando um sonho: "Eu tô tocando com uma banda funk no baile que eu curtia".

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Mano Brown curte o momento no palco do festival Chic Show, no Allianz Parque, em São Paulo, no sábado (13)
Imagem: Van Campos/AgNews

No telão de LED são projetadas imagens do centro de São Paulo. Brown conclama o público a identificar de qual parte da cidade são: zona sul, leste, norte ou oeste. Faz assim referência à missão inclusiva da Chic Show, sempre reafirmada pelo fundador Luizão, de unir os jovens negros de toda a cidade.

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Lauryn Hill faz um dos shows internacionais mais aguardados do ano no Brasil no festival Chic Show, no sábado (13), em São Paulo
Imagem: Van Campos/AgNews

A grande atração da noite, Lauryn Hill, entrou no palco com uma hora de atraso. Majestosa, com tranças azuis e amarelas e uma imensa saia azul celeste, a artista imperou sobre o estádio por quase três horas, fazendo render seu repertório curto (basicamente, um único álbum solo de estúdio, "The Miseducation of Lauryn Hill", de 1998, e dois álbuns de sua ex-banda Fugees).

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Neto de Bob Marley, YG se apresenta no show da mãe, Lauryn Hill, no festival Chic Show 50 Anos, em São Paulo
Imagem: Van Campos/AgNews

Trechos do show ficaram a cargo de seus dois filhos artistas, Zion Marley e YG Marley, que apresentaram suas músicas ao estilo reggae, e o ex-Fugee Wyclef Jean, que trouxe faixas de sua carreira solo, incluindo "Hips Don't Lie", dueto gravado com Shakira em 2005.

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Zion Marley, filho de Lauryn Hill, no palco do festival Chic Show 50 Anos de Black Music, no Allianz Parque, em Sa?o Paulo, no sábado (13)
Imagem: Stephan Solon/Divulgac?a?o

As participações proporcionaram quebras estratégicas no fluxo do show para Lauryn voltar a cada vez com potência renovada. Seu vigor é impressionante, seja na hora do rap de "Doo Wop (Do That Thing") ou no vocal comovido de "Killing Me Softly" (que ganhou na noite uma base meio samba). A intensidade de sua entrega, onde cabem momentos de emoção em que ela chega a enxugar lágrimas, pega o público de jeito.

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Lauryn Hill no palco do festival Chic Show 50 Anos de Black Music, no Allianz Parque, em Sa?o Paulo, no sábado (13)
Imagem: Stephan Solon/Divulgac?a?o

Houve problemas com o retorno de palco (Lauryn chegou a reclamar no microfone) e o som chegava algo embolado em seções das cadeiras, mas a grandiosidade da performance suplantou as escorregadas da equipe técnica. O estrondoso final com "Fu-Gee-La" pôs em ebulição um público de muitas gerações.

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Lauryn Hill e Wyclef Jean durante show no festival Chic Show
Imagem: Amon Borges/Divulgação

Um momento especial para coroar a trajetória do baile que foi fundamental para consolidar a música preta do Brasil e de fora como uma tradição paulistana.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Legenda em foto identificou erroneamente Wyclef Jean, músico que participou do show de Lauryn Hill; a informação foi corrigida.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL