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Na Arábia Saudita, banda feminina de rock aproveita a diminuição das restrições sociais

27/05/2024 18h15

Inclinada sobre o microfone na capital da Arábia Saudita, Nora soltou um grito animalesco. As guitarras soavam e a bateria pulsava atrás dela como parte de uma apresentação com sua banda, em um show recente.

A apresentação da Seera, uma banda de rock psicodélico formada por mulheres, que mistura melodias árabes tradicionais com a psicodelia ressurgente de bandas como Tame Impala, teria sido impensável apenas alguns anos atrás no país.

Mas agora que a Arábia Saudita vem afrouxando algumas restrições em sua sociedade, a Seera representa a forma como as mulheres estão agora encontrando sua voz e se expressando por meio da arte, num país há muito associado ao Islã ultraconservador e à estrita separação entre gêneros.

"Não sabíamos como as pessoas reagiriam", conta Meesh, baixista da banda, que, assim como suas colegas, pediu para ser identificada apenas por seu nome artístico. "Acreditamos profundamente na autoexpressão. Para nossa surpresa, eles realmente estavam de braços abertos para a gente."

O nome da banda, Seera, pode significar "vida" ou "biografia" em árabe. As artistas da banda dizem que tentam abraçar os múltiplos significados possíveis de uma palavra na língua em suas composições, seja através da bateria e dos pratos ou do sintetizador que acompanha as guitarras.

O estilo musical da Seera gira em torno das experiências de vida das quatro integrantes da banda, todas de nacionalidade saudita. Eles cantam no dialeto saudita do árabe, e a baterista, Thing, usa um véu vermelho sobre o rosto, com bordados tradicionais.

"Achei que isso seria um ótimo reflexo da cultura, da herança e das raízes", diz ela. "Ao mesmo tempo, seria uma representação bacana entre o tradicional e o moderno e a expressão disso. Isso também faz parte da nossa identidade sonora."

A Seera enfatiza que não é a primeira banda feminina do país. Na verdade, atribuem esse mérito à banda The Accolade, formada em 2008, que só podia se apresentar clandestinamente. As coisas mudaram radicalmente no reino nos últimos anos, desde a ascensão do rei Salman e do seu assertivo filho, o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman.

Em 2018, as mulheres conquistaram o direito de dirigir. Foram abertos cinemas e outros locais de entretenimento para o público feminino. As mulheres não são mais obrigadas a usar a abaya preta, que cobre totalmente o corpo.

Ainda permanecem limites claros à liberdade de expressão e a qualquer atividade política no país governado com mão de ferro. Mas no campo das artes, a Arábia Saudita está lentamente se abrindo, como ficou claro no show da Seera no início deste mês no The Warehouse, um espaço de música ao vivo no bairro de Diriyah, em Riad.

Ali, dezenas de jovens com jaquetas de couro e camisetas pretas de bandas de rock dançavam ao som da música. Um jovem maquiado com delineador pesado nos olhos usava uma camisa que dizia: "EU ODEIO A VIDA". Os estilos se assemelhavam a qualquer show punk no Ocidente, embora não houvesse consumo de cigarros ou bebidas alcoólicas.

"As coisas estão definitivamente melhores, caminhando mais no sentido da inclusão, e numa perspectiva mais ampla e de uma forma mais ampla", diz Thing. "Definitivamente, há espaço para mais crescimento."

A Seera planeja lançar seu álbum de estreia ainda este ano. Elas também marcaram seu primeiro show internacional em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, onde terão a chance de se apresentar fora da Arábia Saudita pela primeira vez.

Nora gostaria que a banda fosse "uma inspiração para a geração mais jovem" se expressar.

"Não há problema em ter uma aparência, agir e se comportar da maneira que você quiser, desde que não esteja prejudicando ninguém", disse.

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Esta matéria foi originalmente publicada em inglês em 20 de maio de 2024.

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