Vai um iFood? Dominatrix ganha lanches para apenas ser vista comendo
Há poucos mimos melhores do que ganhar comida, não é mesmo? Que o digam os 129 mil membros do "Grupo onde homens pagam iFood para mulheres", do Facebook. O fórum virtual reúne gente pedindo comida e os "pagadores de lanche" que, pelo simples prazer do gesto, distribuem seus presentes.
Por lá, a coisa nem sempre é sexual, mas, para a dominadora Azazel*, de 27 anos, isso ganhou contornos de fetiche.
Profissional do BDSM, a cearense de Fortaleza tem como foco do seu trabalho as sessões presenciais ou por chamadas com submissos — também chamados de servos, são pessoas que curtem receber ordens de sua "dom". Entre os tipos de dominação, há a financeira, incluindo, para alguns, o gosto por vê-la se alimentando.
Como vem ocorrendo com camgirls e outras mulheres que trabalham no entretenimento adulto, Azazel já ganhou hambúrgueres e outros alimentos de submissos que esperam em troca apenas uma coisa: vê-la comendo.
Alguns são apenas servos mesmo, enquanto com outros já tenho uma relação mais comercial. Eles pagam por algum conteúdo ou por algum tempo de sessão virtual
Azazel
Um de seus servos pagava por essas sessões extras. E ele só queria vê-la degustando seus presentes.
Ele me perguntava, às vezes, se eu estava disponível para as chamadas de vídeo. Nessas ocasiões, me mandava o dinheiro do lanche mais o da sessão. E o vídeo era só para me ver comendo mesmo, não tinha nem muita interação.
Apesar de os clientes terem um prazer sexual, a prática não significa que ela precise estar sem roupa ou ter interações com seu corpo e a comida.
Grupos de 'paga lanches' e quando isso vira fetiche
O "Grupo onde homens pagam iFood para mulheres" tem, em sua maioria, homens pagadores enviando lanches a mulheres — ainda que algumas mulheres também gostem de dar mimos. Há dominadoras e submissos no grupo, mas essa relação não é obrigatória e nem mesmo a conotação sexual é explícita na comunidade. A maioria simplesmente gosta de realizar os pedidos feitos nas postagens.
O prazer de ver alguém comendo pode vir de diversas fontes, além da sensação erótica de estar servindo ou de mandar em outro, como explica a sexóloga Dani Fontinele:
A pessoa pode sentir tesão em ver de que forma o outro come, ou se faz isso de forma parecida com outras pessoas, se conversa enquanto come. Cada um terá a sua motivação.
Fontinele
Comer é um ato prazeroso por si só, mas para ser considerado um fetiche, esse prazer deve estar no campo sexual, de acordo com ela.
"Existe o prazer que não é sexual. Sempre que ele se encaixar só como algo gostoso, não é considerado um fetiche. Se uma pessoa tem uma fantasia, sempre vai ter outra pessoa no mundo que também tem aquilo. Se você pesquisar, sempre vai ter um grupo que compartilha daquilo", afirma Fontinele.
Feederismo vai além - e de forma perigosa
Os termos "sexo" e "comida" têm buscas elevadas em redes sociais como o TikTok, que mostra uma tendência mais problemática: o feederismo. Nele, pessoas são vistas comendo muito e exibindo a barriga estufada. O fetiche consiste em um prazer que vai além de alimentar os outros, como no caso de Azazel.
De acordo com Fontinele, o feederismo é uma parafilia — prática sexual considerada fora do comum — que consiste em um prazer erótico na gordura corporal, aliado à comida.
O feederismo está ligado ao ganho de peso, não é o simples ato de comer. O prazer está em alimentar alguém e vê-la engordar ou ser alimentado e ganhar peso.
Fontinele
Há poucas pesquisas sobre o tema, mas algumas dão indícios do que pode estar por trás da parafilia. Uma delas, de acordo com a sexóloga, mediu níveis de excitação ao comer e chegou à hipótese de que o fetiche pode vir do puro prazer em ver alguém se alimentar, que chega ao nível erótico para algumas pessoas.
Outra pesquisa mostra que o feederismo vem de uma junção com a morfofilia, que é a atração sexual por pessoas com uma característica física específica — neste caso, as pessoas que estariam ganhando peso sendo vistas se alimentando. "É importante ressaltar que tudo isso são hipóteses, porque cada pessoa terá uma motivação única para ter um fetiche", diz ela.
Fontinele adverte que a prática de um fetiche jamais deve estar fora do controle e do consentimento de quem está envolvido, até porque neste caso pode gerar distúrbios alimentares.
"Temos de nos ater a nunca fazer mal nem a nós, nem ao outro. Não podemos nunca perder o controle. Se aquilo está ultrapassando os limites e se tornando um relacionamento abusivo ou uma compulsão alimentar, é preciso procurar ajuda", afirma ela.
*Nome artístico - a identidade foi preservada a pedido da entrevistada