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Agência Africa admite que inflou campanha da Brahma campeã em Cannes

Prédio da Housi, em São Paulo, com faixas da campanha da Africa para a Brahma - Reprodução/vídeo apresentado em Cannes
Prédio da Housi, em São Paulo, com faixas da campanha da Africa para a Brahma Imagem: Reprodução/vídeo apresentado em Cannes

Demétrio Vecchioli

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

05/07/2025 09h57

A agência de publicidade Africa Creative DDB admitiu para o UOL que inflou os números de uma campanha que realizou para a Brahma e a startup de moradia Housi durante o Carnaval. A ação foi vencedora de um Leão de Ouro neste ano na categoria "experiência de marca e ativação" no Festival Internacional de Criatividade de Cannes.

No case apresentado no festival, a agência disse que a Brahma pagaria 50% do aluguel de apartamentos locados pela plataforma da Housi em cinco cidades brasileiras — incluindo Rio, Salvador e São Paulo — durante o Carnaval de 2025 em troca da colocação, na fachada dos imóveis, de um cartaz com a frase: "Esse [sic] anúncio bancou o aluguel desse apê no Carnaval".

A Africa afirmou em Cannes que foram instaladas mais de 2.350 faixas, em uma ação com 42% mais retorno do que a mídia out of home (em espaços públicos) tradicional.

Mas o UOL apurou que o impacto da campanha foi muito menor.

Em Salvador, por exemplo, fontes com conhecimento do assunto disseram que foram colocadas faixas, durante um único dia, em menos de 30 apartamentos que já estavam reservados desde o ano passado. Os valores de locação para o período eram de R$ 20 mil, em média. Porém, em vez de metade do aluguel, a Housi ofereceu aos locatários apenas R$ 1,5 mil em dinheiro mais brindes da Ambev, como latinhas de cerveja e garrafas de Skol Beats, pela colocação das faixas.

E mais: os imóveis não tinham relação com a Housi, que não tem penetração relevante nas capitais baiana e fluminense, segundo levantamento do UOL na plataforma da empresa.

Já em São Paulo, o prédio que aparece com maior destaque no vídeo do case vencedor em Cannes, exibindo 12 faixas da Brahma na fachada, fica na avenida Faria Lima e é inteiramente administrado pela startup.

Questionada pelo UOL, a Africa afirmou, em mensagem enviada por sua assessoria de imprensa, "reconhecer que errou na apuração e divulgação dos dados apresentados, dando uma dimensão maior do que realmente aconteceu". "Assumimos total responsabilidade pelas informações contidas no case, elaborado por nós sem aprovação da cliente", disse a agência.

A assessoria de imprensa da Brahma afirmou, também em mensagem, que os dados do case foram apresentados pela agência que executou a ação e que está cobrando esclarecimentos da Africa. Já a Housi, que festejou nas redes sociais o Leão em Cannes como "parceira" da Brahma, respondeu, depois de ser abordada pela reportagem, que foi contratada pela agência para uma prestação de serviços, não tendo conhecimento dos dados contidos no case nem qualquer relação com o prêmio.

Premiação

A Africa foi a agência brasileira mais premiada em Cannes neste ano. Na categoria que venceu junto com a Brahma, resultados (30%), execução (30%), ideia (20%) e estratégia (20%) são os critérios de avaliação do júri de Cannes para premiação.

De acordo com o festival, o trabalho deve demonstrar como a jornada do cliente, a experiência com a marca e a otimização de cada ponto de contato levaram ao aumento da afinidade com a marca e ao sucesso comercial. É obrigatório, no ato de inscrição de uma campanha, que a agência informe ter permissão da marca contratante.

Na edição deste ano da premiação em Cannes, o Brasil foi o principal homenageado e o maior vencedor, com 107 troféus. Entretanto, 12 foram devolvidos pela DM9 — inclusive um Grand Prix, o prêmio principal — depois de uma denúncia anônima de manipulação de um case em vídeo. Outras duas campanhas foram retiradas por conta de uma reavaliação da própria agência.

Por suspeita de irregularidades, a LePub, do grupo Publicis, também está investigando internamente o case de sua campanha para a marca de artigos esportivos New Balance e para o São Paulo Futebol Clube que ganhou um Leão de Bronze na categoria "experiência de marca e ativação". A investigação ocorre por conta de divergências entre os números de engajamento e alcance apresentados no vídeo do case e o que de fato aconteceu na campanha.

Criada em 2002 por Nizan Guanazes e outros sócios, a Africa hoje pertence ao grupo americano DDB. A agência conquistou 777 Leões em Cannes desde 2007. Só neste ano foram 22, sendo dois Grand Prix, três ouros, sete pratas e dez bronzes, segundo levantamento do site especializado "Meio & Mensagem".