Juros altos ameaçam frear crescimento das indústrias de tecnologia

O atual patamar da taxa básica de juros e a permanência fora do radar de futuros cortes são vistos com uma barreira para o desempenho da indústria de tecnologia em 2025. O segmento, formado pelos equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos, responde pela maior alta nominal da indústria no ano passado.
O que aconteceu
Indústria cresceu sustentada pela tecnologia em 2024. Responsável por um quarto do PIB (Produto Interno Bruto), a soma de todos os bens e serviços finais produzidos no país, o setor avançou 3,1% no ano passado. O desempenho foi impulsionado pelo salto de 14,7% da fabricação de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos.
Ventos sopraram a favor da indústria tecnológica. "O cenário macroeconômico do ano passado era o que estava ainda bastante estável, com programas de estímulo do governo, inflação sobre controle e juros moderados perto do que vem pela frente", afirma Alexandre Ostrowiecki, CEO da Multi, ao analisar o resultado positivo da atividade.
Expansão da inteligência artificial contribui com o resultado. A popularização do ChatGPT na rotina da população e das companhias é citada como um dos pontos positivos para o desempenho do segmento. "O uso da inteligência artificial exige computação de borda, com o processamento dos dados em servidores e datacenters", diz Carlos Nazareth Marins, diretor do Inatel (Instituto Nacional de Telecomunicações).
A IA vai causar uma explosão de demandas por servidores e de energia para aguentar todos esses datacenters. Parece ser a mais importante invenção humana da história.
Alexandre Ostrowiecki, CEO da Multi
Atividade manteve expansão no último trimestre do ano. A variação positiva de quase 3% do ramo tecnológico entre setembro e dezembro impediu uma perda maior do setor, que perdeu fôlego em cada um dos últimos meses de 2024. O intervalo de três quedas consecutivas não era observado pela indústria desde o período entre fevereiro e abril de 2021.
Desaceleração deve persistir pelos próximos meses. "Estamos sentindo um movimento contrário em relação ao início de 2024 por conta do momento marcado pelo dólar mais alto e taxa de juros mais elevada. Isso traz certo receio neste ano", avalia Wilson Périco, representante do Sinaees (Sindicato das Indústrias de Aparelhos Eletro Eletrônicos e Similares de Manaus), entidade de classe que representa a produção de equipamentos de tecnologia na Zona Franca.
Selic surge como pedra no sapato
Nível elevado da taxa Selic representa um freio para a indústria. O remédio contra o avanço da inflação já reflete negativamente nos resultados do setor. O cenário tende a desestimular até mesmo o bom desempenho das atividades ligadas à tecnologia. "A indústria de eletroeletrônicos não se beneficia somente dos consumidores finais, mas também do desempenho positivo de todos os segmentos econômicos", afirma Nazareth.
Se a indústria de alimentos cresce, inevitavelmente, vai precisar usar mais informática e telecomunicação.
Carlos Nazareth Marins, diretor do Inatel
Selic deve alcançar maior nível em 19 anos no primeiro semestre. Já antecipada pelo Copom (Comitê de Política Monetária), a terceira alta de 1 ponto percentual levará a taxa básica de juros a 14,25% ao ano em março. Sem indicativos de que a elevação será a última, o mercado financeiro projeta a taxa em 15% ao ano no mês de junho. Se confirmado, será o maior patamar da taxa Selic desde julho de 2006.
Juros mais altos inibem o consumo e o desenvolvimento. Sempre que o BC (Banco Central) decide aumentar a taxa Selic, o objetivo central está na desaceleração do consumo para conter a inflação. Com a menor intenção de compra e o crédito mais escasso, os vereditos do Copom tornam mais atrativos os investimentos e afastam o dinheiro do comércio, dos serviços e das linhas de produção.
Os produtos eletroeletrônicos e informáticos têm 90% dos insumos importados. Com o dólar mais alto, esses artigos ficam mais caros. No varejo, quem opta pelo financiamento absorve a alta dos preços pelo impacto cambial e por conta da taxa de juros.
Wilson Périco, representante do Sinaees
Ambiente fiscal também preocupa representantes do setor. O temor do mercado financeiro é compartilhado pela indústria, que vê o controle das contas públicas como determinante para interromper o ciclo de aumento dos juros. "Se nos preocuparmos com essa credibilidade e controle do déficit primário, o Brasil pode despontar como uma grande fábrica mundial", afirma Nazareth.
Teremos as tecnologias macro puxando a indústria para a frente e o cenário macro para trás.
Alexandre Ostrowiecki, CEO da Multi