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Para Conab, ter três safras de grãos 'minimiza déficit de armazenagem'

Investimentos em novas estruturas para armazenagem estão aumentando - Nacho Doce/Reuters
Investimentos em novas estruturas para armazenagem estão aumentando Imagem: Nacho Doce/Reuters

Mariana Grilli

Colaboração para o UOL, em São Paulo

17/01/2025 13h40

O Brasil não tem onde estocar o volume de grãos que produz. De 2010 a 2023, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), o crescimento da safra de grãos foi de 134%, enquanto a capacidade de armazenagem cresceu 53%. Tamanha eficiência na lavoura torna-se um problema logístico, implicando em perdas de produtividade e rentabilidade.

Segundo o órgão, o país consegue armazenar 210 milhões de toneladas de grãos. Na safra 2024/25, a colheita estimada é de 322,3 milhões de toneladas. Mesmo a conta não fechando, o órgão alega que "não se pode afirmar que o país possui um déficit de armazenagem de 112,3 milhões de toneladas".

A existência de três safras de grãos, para a Conab, é uma "vantagem comparativa que minimiza o déficit de armazenagem", pois possibilita "maior movimentação dos produtos dentro do armazém, durante todo o ano, o que reduz a necessidade de novas estruturas armazenadoras".

De olho no campo, a Câmara Setorial de Equipamentos para Armazenagem de Grãos da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) fala em "colapso logístico no pós-colheita".

Segundo a própria Conab, um dos principais objetivos da armazenagem é "facilitar a negociação de melhores preços, tanto no território nacional como no mercado de exportação, proporcionando maior estabilidade de preços e de mercados".

No entanto, o órgão se contradiz quando admite que em algumas regiões - como Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia, Sergipe e Alagoas-, "verifica-se um déficit maior de estruturas armazenadoras, o que, muitas vezes, obriga os produtores a destinarem imediatamente a sua produção para o exterior".

Ao todo, 98% da safra está em armazéns privados e somente 2% estão em infraestruturas públicas. Vale esclarecer que não há problema em haver armazéns privados, mas só uma parcela de produtores e cooperativas consegue arcar com os custos milionários para construir essas infraestruturas.

"Armazenagem é importante, porque dá a segurança de o produtor comercializar o produto no momento mais favorável, e não porque o produto está perecendo", observa André Farias, analista da Embrapa Territorial.

A unidade da Embrapa publicou, em dezembro, um sistema de inteligência com dados do setor agropecuário, incluindo informações do Sistema Nacional de Cadastro de Unidades Armazenadoras da Conab. O objetivo é dar condições de fazer política pública fundamentada em dados científicos e técnicos. "A ideia é que isso seja utilizado de maneira massiva pelo setor, trazendo ganhos técnicos nas escolhas que são tomadas por gestores públicos e iniciativa privada", afirma.

Ainda segundo a Conab, uma possibilidade de arrefecer o problema da armazenagem é o programa de financiamento para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), voltado a produtores e cooperativas rurais. Ainda assim, tomar crédito com juros que variam de 7% a 8,5% ao ano, com prazo de reembolso de até 10 anos, nem sempre é viável ao produtor rural de pequeno e médio porte.

Dentro dessa realidade dos grãos, está a dupla arroz e feijão. Dos 210 milhões de toneladas que podem ser estocados, há espaço para guardar somente 22 milhões de toneladas de produtos que requerem armazéns convencionais, como é o caso de arroz, feijão e café. O restante da capacidade de armazenagem (88%) é para soja, milho, trigo, e outras commodities majoritariamente exportadas.

Sobre isso, a Conab alega que, desde 2023, "vem recebendo investimento recorde". A média de investimentos anuais entre 2014 e 2022 era de R$ 2,5 milhões. Em 2023 e 2024, houve aportes de R$ 12 e R$ 13 milhões. A expectativa de investimentos para 2025 é superior a R$ 60 milhões.

Mas, se a própria Conab, fala em redução de necessidade de novas estruturas armazenadoras... para que seriam estas quantias?

Depois de explicações controversas em nota, o órgão conclui: "A capacidade armazenadora brasileira é um desafio frente à forte expansão da produção, mas que vem sendo enfrentado ao longo dos anos com investimentos públicos e, principalmente, privados".

Câmara de Agrocarbono no Ministério da Agricultura quer pautar políticas públicas

O Ministério da Agricultura e Pecuária possui 39 câmaras setoriais e temáticas, sendo a mais nova criada em 2024: Câmara Temática de Agrocarbono Sustentável. O objetivo é estabelecer um debate sobre políticas públicas que promovam a produção sustentável atrelada à conservação ambiental.

Na prática, isso requer diálogo com 75 entidades que formam a câmara, entre setor público e privado, e levar essas demandas ao ministro Carlos Fávaro. Daí, estabelecer pontes com outros órgãos, como o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério da Fazenda - que cuida, por exemplo, do orçamento para o Plano Safra.

A tarefa, nada fácil, está embasada em cinco pilares: conformidade ambiental, taxonomia, rastreabilidade, finanças sustentáveis e a participação nos mercados de carbono. Ao UOL, o presidente da câmara temática, Eduardo Bastos, explica brevemente os objetivos perseguidos, sobretudo com a contagem regressiva à COP30, em novembro.

UOL - Qual o motivo da criação dessa câmara temática de agrocarbono dentro do Ministério da Agricultura (Mapa) e quais são as prioridades?

Eduardo Bastos - Aproximadamente 25% da emissão de CO2 no Brasil é do agro, é a segunda maior emissão. Não tem como avançar numa agenda de descarbonização sem ter o agro na mesa. Historicamente, são agendas vistas como não convergentes, então, a ideia da câmara é trazer essa convergência, trazer todo mundo para o diálogo. Um dos pontos prioritários é a câmara do carbono ser um instrumento legal de apoio à política pública, ser um instrumento de assessoramento.

UOL - Essa agenda climática é liderada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). Por que essa câmara foi criada no Mapa e não no MMA?

Eduardo Bastos - A ideia foi justamente de colocar o agro na linha de frente dessa discussão, colocar dentro do Ministério da Agricultura para puxar os setores do agro. As câmaras só podem ser compostas por entidades da sociedade civil, então pode ser uma associação de produtores, associação da indústria, também temos ONGs, é bem plural. A maioria destes membros tem interlocução com o Ministério da Agricultura. Não estamos ali para discutir descarbonização do setor químico, elétrico, de transportes. É uma discussão de como o agro pode contribuir, e ele pode contribuir com quase tudo. Mas, sim, a gente tem interlocução fora, inclusive tem, pelo menos, seis ministérios da Esplanada que participam da câmara ativamente.

UOL - Onde a câmara temática quer chegar? Qual é o objetivo com tantas interlocuções?

Eduardo Bastos - Um dos pontos prioritários é qualificar o debate. Porque, infelizmente, a agenda ambiental passou a ser vista como uma agenda de esquerda, e a agenda do agro é vista como uma agenda de direita. No final do dia, o produtor quer plantar, quer colher, quer entender se tem oportunidade de ganhar dinheiro com o mercado de carbono e o governo não tem uma compreensão plena do uso do termo. Em um momento de PL do Carbono, revisão do Plano Clima e inventário nacional de efeito estufa, a gente viu claramente que o agro precisa entrar para qualificar o debate e mapear oportunidades. Como contabilizar o quanto captura [de carbono], além de falar da emissão. A regulação do mundo é focada em energia, e a gente precisa explicar para o agro que a agenda ambiental é de oportunidade, mas os riscos climáticos existem. A gente viu com muita clareza que as pessoas não entendiam, inclusive, os cálculos de emissão de gases de efeito estufa. Por isso, criamos a câmara, para qualificar o debate e nortear políticas públicas.

UOL - Para 2025, as pautas prioritárias já estão estabelecidas?

Eduardo Bastos - No início de fevereiro, temos uma reunião em que a proposta é ouvir do Ministério da Agricultura quais são as inquietudes nessa agenda, estabelecer quem vai fazer o inventário nacional de efeito estufa, entender as demandas do setor e do ministério. As datas de reuniões para 2025 já estão fechadas, mas as pautas ainda não. Com certeza o tema principal é a COP30.

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