Topo
Notícias

Seminário na Argentina vira palanque da esquerda internacional pela eleição de Lula

19/08/2022 06h32

No seminário internacional que reuniu líderes da esquerda latino-americana em Buenos Aires, o ex-chanceler Celso Amorim, braço direito de Lula na campanha eleitoral, advertiu que o futuro da integração regional e da procura pela paz mundial depende do resultado eleitoral no Brasil.

Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

O ex-presidente Lula foi o ausente mais presente no seminário internacional "Unidade na Diversidade" que se encerrou na noite desta quinta-feira (18) em Buenos Aires com a participação de lideranças da esquerda latino-americana.

"Respeitamos o princípio de não-intervenção e de autodeterminação dos povos, mas não podemos ocultar o nosso carinho e a nossa simpatia pelo povo do Brasil e pelo seu dirigente Lula. Desejo o melhor a Lula, o melhor nas próximas eleições", disse o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, através de videoconferência, recebendo os aplausos da plateia em Buenos Aires.

"Agradeço ao presidente do Brasil, o senhor Bolsonaro, que nunca tenha feito uma declaração contra mim, e nem eu a ele, eu o respeito", esclareceu López Obrador. "Mas não consigo. Quando o Lula esteve no México, eu disse que o Lula será uma bênção para o povo do Brasil. E eu acredito nisso, de verdade", reforçou o presidente mexicano, justificando os elogios sob o argumento de que "a política é razão, mas também é paixão".

Na sequência de López Obrador, o presidente argentino, Alberto Fernández, encerrou o seminário, reforçando as palavras do seu homólogo mexicano.

"A verdade é que o que Andrés Manuel disse sobre Lula é o mesmo desejo que eu tenho: que o Lula se saia muito bem (nas eleições) porque isso fará muito bem ao povo do Brasil e a toda a América Latina", desejou o anfitrião, último orador de uma jornada que começou à tarde com a participação do ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.

Integração latino-america depende da vitória de Lula, diz Amorim

O ex-chanceler Celso Amorim, braço direito de Lula na campanha eleitoral, avisou aos líderes latino-americanos que o futuro da integração regional e da procura pela paz mundial depende do resultado eleitoral no Brasil.

"Aqui (no Brasil) não é somente uma questão de direita ou de esquerda, como pode acontecer em muitos países. É uma questão entre uma visão racional, democrática e plural do mundo e uma visão que tem pouca relação com os valores civilizatórios, entre os quais o da integração", diferenciou Amorim, em videoconferência.

"Peço desculpas por falar de forma virtual porque estou envolvido nos assuntos da campanha eleitoral do presidente Lula, absolutamente fundamental para o futuro da região", explicou o ex-ministro das Relações Exteriores de Lula entre 2003 e 2010 e da Defesa da ex-presidente Dilma Rousseff, entre 2011 e 2014.

Na visão de Celso Amorim, se Bolsonaro for eleito, o Brasil continuará de fora da integração regional. Sem o país que representa metade da região em termos territoriais e econômicos, a região perde voz perante os desafios mundiais.

"Temos de trabalhar por essa integração. É para o nosso benefício, mas importante para que a nossa voz seja escutada no plano global. A América Latina e o Caribe, com a sua tradição de paz, pode aprofundar a necessidade de uma nova governança global, mas para que a voz da América Latina e do Caribe seja escutada, é necessário que estejamos juntos", indicou.

Isolamento do Brasil

Para o ex-ministro, Bolsonaro isolou o Brasil não apenas dos seus vizinhos.

"Muitas vezes foi dito que Bolsonaro e Alberto Fernández não se falam. Não é uma questão entre Bolsonaro e Alberto Fernández. Bolsonaro não fala com ninguém", sublinhou Amorim em relação ao distanciamento ideológico entre os presidentes de Brasil e Argentina, cuja união historicamente sempre marcou o eixo da integração regional.

O apoiador de Lula na corrida eleitoral e protagonista na campanha internacional pela liberdade do ex-presidente acredita que os desafios para a integração da América Latina vão passar não apenas pelos interesses da região, mas pelo papel que essa integração possa ter na sobrevivência da humanidade em relação a três ameaças: mudanças climáticas, pandemias e desigualdade social.

"Temos de pensar numa integração que seja propícia para a sobrevivência da humanidade. Estamos diante de uma ameaça real à sobrevivência humana não apenas pelo clima, pela pandemia ou pela desigualdade, mas também pela guerra. É a primeira vez, desde 1945, que a guerra sai da periferia ao centro do sistema. E isso é uma ameaça real porque há uma ameaça de utilização de armas nucleares", alertou.

Perigo nuclear minimizado pela Europa

O ex-chanceler observa que, apesar da ameaça nuclear, a Europa não tem dado urgência à procura da paz.

"Claro que imputam essa responsabilidade aos russos, mas isso pouco importa. Venha de onde vier, isso representa um grande perigo. Não tenho certeza que vamos conseguir evitar (o uso de armas nucleares). O que sinto dos nossos amigos europeus, cujo papel é fundamental para um mundo multipolar, é uma falta de urgência em relação à paz", apontou.

"Espero que a América Latina e o Caribe, com a sua vocação de paz, possam contribuir para que o mundo encontre uma rota de paz e de cooperação. Eu sinto a falta de urgência na procura pela paz", insistiu.

O seminário que reuniu líderes da região debateu a integração da América Latina e do Caribe é promovido pela Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), atualmente presidido pela Argentina, e pela Corporação Andina de Fomento (CAF), um banco de desenvolvimento regional.

Participaram, entre outros, líderes identificados com a esquerda regional como o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, e os ex-presidentes de Uruguai, José Mujica, da Colômbia, Ernesto Samper, e da Espanha, José Luis Rodríguez Zapatero.

Regresso do Brasil

A CELAC foi criada em 2010 sob o argumento de que a Organização dos Estados Americanos (OEA) é um âmbito que responde aos interesses dos Estados Unidos.

Em 15 de janeiro de 2020, alinhado aos interesses dos Estados Unidos, o governo de Jair Bolsonaro decidiu suspender a participação do Brasil. O objetivo foi esvaziar o peso do foro, mas, sobretudo, a voz de Cuba, Venezuela e Nicarágua, regimes autoritários da região.

"Quero propor cinco eixos para a integração, mas primeiro precisamos que o Brasil regresse, mas com Lula, claro, com Lula", disse, sob aplausos, Alicia Bárcena, ex-secretária-executiva da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) e atual embaixadora do México no Chile.

"Temos de ir a essa integração regional, mas temos de estar muito alertas: há muita esperança com o governo de Gabriel Boric (Chile), com o governo de Gustavo Petro (Colômbia) e há muita esperança com Lula, mas quando a ação política não muda nada na sociedade surge a indignação de uns e a perplexidade de outros", advertiu. "Quando as perspectivas de bem-estar se frustram, as instituições democráticas se ressentem e o ambiente se torna propício para a volta das velhas elites", concluiu Bárcena.

Notícias