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Do Japão ao Brasil, pessoas tomam 'banho de floresta' para aliviar estresse

Banho de floresta "pegou" no Japão e se espalhou para outros países desde os anos 1980 - Getty Images
Banho de floresta 'pegou' no Japão e se espalhou para outros países desde os anos 1980 Imagem: Getty Images
do UOL

De Ecoa, em São Paulo

19/08/2022 06h00

Nos anos 1980, a vida no Japão tinha se tornado mais urbana, mais tecnológica, mais confinada em escritórios — e mais estressante. Foi nesse cenário que autoridades florestais japonesas criaram o conceito de "shinrin-yoku", ou banho de floresta, para incentivar a população a resgatar sua ligação com a natureza por meio de visitas relaxantes a parques nacionais e outras áreas verdes.

O banho de floresta pegou: muitos japoneses aderiram e os efeitos positivos da prática chamaram a atenção de cientistas, que passaram a realizar estudos sobre seus impactos fisiológicos e psicológicos.

Essas pesquisas comprovaram o que já era perceptível entre os praticantes do banho de floresta: ele é capaz de reduzir a frequência cardíaca e a pressão arterial, diminui a produção de hormônios do estresse, estimula o sistema imunológico e melhora a sensação geral de bem-estar. Com base nessas evidências, o "shinrin-yoku" se tornou parte importante da política de saúde preventiva do Japão.

Banho de floresta nos biomas brasileiros

Foi por volta de 2007 que o psicólogo Marco Aurélio Bilibio ouviu falar dos banhos de floresta pela primeira vez. Fundador do Instituto Brasileiro de Ecopsicologia (IBE) em Brasília, Bilibio foi um dos primeiros a introduzir essa abordagem da psicologia no país.

"A ecopsicologia busca olhar o ser humano sempre conectado com o seu ecossistema e também na relação com as outras espécies. Somos seres essencialmente ecológicos e a nossa saúde depende da nossa relação com os outros humanos mas também com os ecossistemas. Há uma equivalência entre o adoecimento dos ecossistemas e os adoecimentos humanos", disse o psicólogo a Ecoa.

O instituto é o principal centro de pesquisa e ensino da ecopsicologia no Brasil e tem formado pessoas para atuar como facilitadores da reconexão com a natureza, chamados de "ecotuners". O curso está na segunda turma - ao final dele, 85 ecotuners de diferentes partes do país terão sido formados para aplicar banhos de floresta e outras metodologias.

Em 2021, a Fiocruz assinou um acordo de cooperação técnica e científica com o Instituto Brasileiro de Ecopsicologia para desenvolver o banho de floresta no Brasil. Com duração de cinco anos, o projeto envolve a definição de protocolos para a vivência, a capacitação de facilitadores e a elaboração de diretrizes para certificar áreas naturais para a prática.

banho de floresta - Divulgação - Divulgação
Banho de floresta realizado no Parque Nacional de Brasília em 2017; ao centro, Marco Bilibio, diretor do IBE
Imagem: Divulgação

Também estão previstas pesquisas para verificar a reação orgânica da população aos biomas brasileiros. "As pesquisas [anteriores] foram feitas em biomas japoneses", lembra Marco Bilibio. "Como será que nós reagimos a um banho de floresta feito no Cerrado, na Mata Atlântica, ou na Amazônia?"

O diretor do IBE promoveu em 2017 o que afirma terem sido os primeiros banhos de floresta realizados na esfera pública no Brasil. As experiências aconteceram no Parque Nacional de Brasília, e tiveram a intenção de apresentar a prática aos gestores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão responsável pelas unidades de conservação federais.

A ideia é que a disseminação da prática em matas preservadas do Brasil também contribua para a proteção dos ecossistemas, seja através da sensibilização do público geral ou da renda gerada para as comunidades locais, que poder ser capacitadas para atuar como facilitadoras dos banhos de floresta.

"Uma das nossas linhas de pesquisa no projeto com a Fiocruz é justamente a caracterização de áreas e os cuidados que os gestores precisam ter para prepará-las para banhos de floresta", afirmou Bilibio.

Como tomar um banho de floresta?

Caminhar devagar ou ficar sentado em silêncio e com atenção plena voltada a si próprio e ao ambiente, seja em uma floresta ou em outras áreas verdes como os parques urbanos, são algumas das indicações básicas para quem deseja aderir ao banho de floresta.

O tempo e a periodicidade recomendados para uma sessão são de pelo menos duas horas, uma vez na semana. Mas, para quem tem menos tempo, reservar um mínimo de dez minutos todo dia ou sempre que possível para uma imersão meditativa na natureza já traz alguns benefícios.

O que caracteriza o banho de floresta é que o que se busca ali é uma experiência de relaxamento profundo, de se abrir para o que uma floresta oferece como experiência. E ela oferece literalmente um banho de sensações. Esse despertar sensorial que é estimulado pelo ambiente de uma floresta coloca a pessoa no que a gente chama de 'green mindfulness', um estado de atenção plena para a natureza.
Marco Bilibio, diretor do Instituto Brasileiro de Ecopsicologia

Inicialmente, é aconselhável que a atividade seja praticada com um guia especializado, que, na definição de Marco Bilibio "é uma pessoa que prima pela sensibilidade, não pelo desafio físico". Essa sensibilidade em relação à natureza é o que permite regular ritmos e estimular a percepção sensorial para que o praticante se reconecte à natureza.

Depois que se aprende, o banho de floresta vira uma prática pessoal que pode ser feita de maneira autônoma.

'O ar da floresta é terapêutico'

A explicação do bem que as florestas e áreas verdes fazem à saúde física e mental está no ar: as substâncias liberadas pelas árvores na atmosfera, chamadas de fitocidas, seriam as maiores responsáveis por provocar reações físicas e no humor das pessoas.

Um dos exemplos comprovados desses benefícios é que a exposição aos fitocidas é capaz de aumentar a quantidade e a atividade das células exterminadoras naturais, essenciais para o sistema imunológico, como mostrou um estudo realizado na Escola de Medicina Nippon, em Tóquio.

"Depois das pesquisas ficou mais claro como a expressão banho de floresta foi uma escolha acertada, porque quem entra numa floresta, recebe um banho de substâncias orgânicas. O ar da floresta é terapêutico", disse Bilibio.

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