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Hiperconexão muda hábitos e franceses não relaxam mais durante as férias

13/08/2022 09h48

Pressão do trabalho, impacto da pandemia, intrusão provocada pelas novas tecnologias. De acordo com a revista L'Obs, para muitos franceses as férias já não oferecem mais uma verdadeira ruptura com seus empregos, sob o risco de exaustão.

Pressão do trabalho, impacto da pandemia, intrusão provocada pelas novas tecnologias. De acordo com a revista L'Obs, para muitos franceses as férias já não oferecem mais uma verdadeira ruptura com seus empregos, sob o risco de exaustão.

É o caso de Lucie, advogada criminalista citada pela reportagem e que, mesmo em licença maternidade, não deixa de ler todos os e-mails profissionais, por medo de perder algum prazo importante para os clientes. A sensação de "conexão permanente" também é descrita por Paul, funcionário de uma star-up para quem "os grupos de WhatsApp são uma ferramenta mortal para a paz de espírito".

Um estudo da Fundação Jean-Jaurès, de 2019, mostra que 31% da população francesa associa as férias com um descanso merecido. Porém, a pausa total constitui uma atividade rara, de acordo as entrevistas feitas pela L'Obs. "Uma montanha de trabalho nos aguarda no retorno e isso torna a desconexão complicada", afirma Julien, gerente de uma empresa de importações.

Questão cultural

Entretanto, se você perguntar a qualquer estrangeiro sobre um clichê francês, muitos dirão "um povo obcecado por suas férias remuneradas". A ponto de o direito à desconexão ter sido inscrito no Código do Trabalho em 2016. Enquanto em outros países, a interdição de o empregador contactar seus funcionários nas folgas é vista como algo impensável.

A realidade, no entanto, é bem diferente, revela a publicação: "os franceses são cada vez mais invadidos pelo seu ganha-pão nos momentos consagrados ao descanso".

Um estudo realizado pela plataforma de recrutamento Qapa, em 2020, aponta que 71% dos franceses respondem aos e-mails ou ligações profissionais nos dias "off". E mesmo se mais da metade se dizem incomodados por esta hiperconexão, um estudo da Opinionway, de 2018, indicava que 63% dos entrevistados se culpabilizavam por não se conectarem durante as férias.

"Nós somos, ao mesmo tempo, mestres e escravos das tecnologias", analisa Sandra Hoibian, socióloga e diretora do Centro de Pesquisa para o Estudo e Observação das Condições de Vida (Crédoc). "Estamos todos envoltos na aceleração do mundo e das novas tecnologias, que deveriam nos fazer ganhar tempo, e temos a impressão de que nos falta tempo", destaca.

Estudos relacionados ao assunto em nível europeu apontam que a França valoriza mais o trabalho do que seus vizinhos. "Para um anglo-saxão, um emprego é um contrato com objetivos. Na França, é um estatuto social e uma maneira de se realizar", compara Hoibian.     

A reportagem alerta, por fim, que a conexão constante ao trabalho pode afetar a produtividade. Andrew Smart, engenheiro da Google, aborda o assunto em seu livro Autopilot: The Art & Science Of Doing Nothing (Piloto Automático: a Arte e a Ciência do Não Fazer Nada, em tradução livre), de 2013. Na obra, o autor explica que "algumas conexões cerebrais se tornam mais ativas quando não fazemos nada em particular", e que é muito importante conseguir ter esses momentos de parada total.

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