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OPINIÃO

Absurdos de Bolsonaro e Lira com Petrobras são inúteis para reduzir preços

do UOL

20/06/2022 17h26

O ataque do presidente Jair Bolsonaro e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), seu braço legislativo, à Petrobras é um absurdo. Mas, se o que não faltam são absurdos ao governo e à ação da Câmara, a pressão sobre a estatal, controlada pela União, acaba sendo algo natural.

Natural, mas não normal. Não é normal o presidente da República pedir a cabeça do executivo que ele mesmo indicou para o conselho de administração e a presidência da Petrobras. Menos normal ainda é o presidente da Câmara ameaçar devassa na vida pessoal de executivos e conselheiros da empresa — a maioria indicados pelo governo — e de seus parentes, para evitar aumentos nos preços do combustíveis.

O absurdo e as anormalidades não estão sendo promovidos para resolver um problema agudo de curto prazo — estabilizar, minimamente, os preços dos combustíveis nas bombas. Fazer oposição ao próprio governo foi a forma radical que Bolsonaro e seu principal aliado no Congresso encontraram para tirar o corpo fora das responsabilidades pelas consequências dos aumentos nos preços dos combustíveis.

Ameaçar instalar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras, lançada por Bolsonaro e detalhada por Lira, em artigo nesta segunda-feira (20), na "Folha", é uma dessas radicalizações. Não faz nenhum sentido e seu único objetivo é ameaçar e constranger os executivos da Petrobras.

Existe uma forma mais direta e mais simples de enfrentar o problema, que parece não interessar a Bolsonaro e Lira. Essa forma consiste na alteração da política de preços vigente. A política atual, lançada em 2016, num dos primeiros atos do governo de Michel Temer, visa a assegurar lucros máximos em curto prazo.

Conforme asseguram diversos especialistas, é possível estruturar uma política de preços que, em lugar do lucro máximo, objetive a obtenção de um lucro suficiente para manter a Petrobras capitalizada, investir, principalmente na transição energética, e remunerar suficientemente os acionistas. As margens de comercialização e rentabilidade da estatal permitem, tranquilamente, a adoção de um política de preços com esses objetivos.

Chamada PPI (Preço de Paridade de Importação), a atual regra de preço determina que a Petrobras repasse às refinarias as altas nas cotações do petróleo nos mercados internacionais, convertidas pela taxa de câmbio do momento. Com as altas nas cotações internacionais, por razões extramercado, como a pandemia e a guerra na Ucrânia, essa política tem resultado em lucros extraordinários.

Detalhe: esses lucros estão sendo distribuídos quase integralmente aos acionistas, sem reservas para investimentos e gestão de dívidas. Em 2021, por exemplo, do lucro avantajado de R$ 106,7 bilhões, um total de R$ 101,4 bilhões, equivalente a 95% do lucro, foi distribuído.

Não há qualquer impedimento a que a Petrobras altere a política de preços, mas alguns limites precisam ser considerados. Um deles, por exemplo, é que o lucro da companhia, derivado da nova política, deve remunerar minimamente os acionistas.

Para evitar recursos à Justiça, ou pelo menos não estimulá-los a recorrer, o lucro deve cobrir no mínimo o custo de oportunidade do investimento. Ou seja, a taxa de retorno garantida pelo lucro, para o acionista, deve superar o custo de investir na empresa.

Além disso, uma política de preços de estatal deve ser "competitiva". As leis que definem que estatais precisam praticar preços competitivos não define, contudo, o que são "preços competitivos". É claro que a empresa não pode, por exemplo, praticar dumping, isto é, vender a preços abaixo dos custos.

Mas, sem ferir a concorrência, estatais podem, segundo as leis, como a a Lei das Sociedades Anônimas, atender ao "interesse público". É o que está previsto para empresas de economia mista, caso da Petrobras.

Tudo somado e pesado, a hipótese de que Bolsonaro e Lira estejam sem coragem de mexer na atual política de preços, levantada pelo coordenador geral da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Deyvid Bacelar, é mais do que razoável. Mexer na política de preços, restringindo as altas, desencadearia a necessidade de adotar outras medidas na direção contrária a da privatização da Petrobras.

Uma outra política que resultasse, por exemplo, num corte linear de 20% nos preços de todos os derivados, criaria dificuldades a importadoras que hoje competem com a Petrobras e garantem parte do abastecimento do mercado. Uma redução de preço desse porte exigiria que a Petrobras assumisse pelo menos a parte das importações que essas empresas deixariam de atender, evitando riscos de desabastecimento.

Segundo o economista Eduardo Costa Pinto, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pesquisador do Ineep, o instituto de estudos sobre petróleo, gás e biocombustíveis mantido pela FUP, se a Petrobras respondesse, nessa situação, por toda a importação de derivados, considerando a situação de 2021, o lucro sofreria um encolhimento de 60%.

Mas, mesmo recuando para R$ 46,8 bilhões, de acordo com os cálculos de Costa Pinto, daria para aumentar investimentos em 25% e distribuir 25% aos acionistas. "A margem líquida recuaria de 23,7% para 11,8%, ainda assim bem acima da margem líquida média obtida pelas grandes petroleiras", assegura o economista.

O resumo da história é o seguinte: Bolsonaro (e Lira) poderiam mexer na política de preços da Petrobras, só não mexem porque não querem ou porque têm medo de mexer, não com os preços dos combustíveis, mas com outros vespeiros políticos e econômicos. Isso para não falar em adoção de imposto de exportação, com alíquotas flexíveis, ou mesmo taxar lucros extraordinários, como outros países estão fazendo.

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