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OPINIÃO

Presidente sugere criar 'fiscais do Bolsonaro' para fiscalizar combustíveis

do UOL

08/06/2022 16h24

Já não há muita dúvida de que a retirada do ICMS na composição dos preços do combustíveis, apesar de toda o problema fiscal que pode trazer para os estados, não tem o poder de baixar o valor dos produtos nas bombas de cada esquina. A razão para isso é que, como não há tabelamento, o espaço aberto na formação dos preços pela retirada de tributos pode ser ocupado por aumento nas margens de lucro, ou compensações pelas variações das cotações do dólar.

O próprio presidente Jair Bolsonaro entendeu esse ponto. Em entrevista à TV nesta terça-feira (7), ele levantou a possibilidade de fiscalizar os preços na ponta dos postos de combustíveis. "A gente vai exigir que a margem de lucro dos tanqueiros e dos donos de postos não seja majorada com a nossa diminuição de impostos", afirmou o presidente.

Bolsonaro acenou com a criação dos "fiscais do Bolsonaro", uma reedição dos "fiscais do Sarney". No embalo do congelamento de preços do Plano Cruzado I, em 1986, o então presidente José Sarney convocou a população a fiscalizar preços em lojas e mercados, tentando impedir dribles no congelamento.

Não funcionou na época e não há hipótese de que funcione agora. Desta vez por uma razão simples e primordial: não há preços tabelados. Além disso, embora o setor de distribuição seja dominado por algumas poucas gigantes — Raízen, Vibra (ex-Br Distribuidora) e Ipiranga —, o mercado ainda comporta quase 200 distribuidoras regionais e opera mais de 40 mil postos, numa complexa rede que abrange o país continental. Há um ano, quando Bolsonaro quis que o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Controle) fiscalizasse as bombas de combustíveis, o órgão declarou não dispor de recursos para a tarefa.

No sistema brasileiro, os tributos são calculados embutidos nos preços finais de venda. Quando há desonerações de impostos, taxas ou contribuições, o espaço criado pode ser apropriado pelo vendedor para baixar preços e melhorar o volume de vendas, quando o mercado consumidor está desaquecido, ou, no sentido inverso, ampliar a margem de venda (e de lucro), se o consumo está forte.

O governo Bolsonaro tem insistido em esquecer esse funcionamento, tendo proposto, com alguma insistência, desonerações de tributos com o objetivo de tentar reduzir preços finais. Começou com jogos eletrônicos, para os quais, desde os primeiros tempos do mandato, ainda em 2019, promoveu três rodadas de cortes de tributos. A prática foi intensificada, abrangendo principalmente alimentos, em 2021 e agora em 2022.

Com as gangorras das cotações do dólar, base de custos dos games, a medida tem se revelado inócua no segmento. O mesmo tem ocorrido com os produtos da cesta básica e outros alimentos desonerados em 2021 e no primeiro trimestre de 2022. As reduções nos preços finais são pouco perceptíveis, quando logo em seguida não ocorrem aumentos de preço.

Na tentativa de dar transparência aos itens que formam os preços do combustíveis, a Câmara aprovou, nesta terça-feira (7), projeto de lei que determina o envio mensal à ANP (Agência Nacional de Petróleo), pelos "agentes atuantes na indústria de petróleo e biocombustíveis", dos valores médios em separado de cada item dos que compõem os preços dos derivados. O projeto seguiu para o Senado.

Já existem leis que determinam a discriminação nas notas e cupons fiscais dos tributos cobrados em cada operação comercial. Devem ser informados, separadamente, os valores cobrados em tributos federais, estaduais e municipais em cada operação comercial. Mas essa obrigação legal não permite o que se quer agora, tornar conhecidas também as margens de comercialização e lucro.

A presunção é a de que, com o aumento da transparência no detalhamento dos preços, a concorrência também aumentará, favorecendo o consumidor. A conferir se as novas exigências vão ser de fato implantados no dia a dia dos negócios, e, mais ainda, se a medida vai funcionar nessa direção.

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