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OPINIÃO

Como Petrobras, empresas lucram alto a curto prazo e não investem no futuro

do UOL

31/05/2022 09h53

A estratégia empresarial da Petrobras, concentrada na obtenção de fortes lucros no curto prazo, desprezando investimentos na capacidade de a empresa ser competitiva no futuro, parece estar sendo reproduzida, neste momento, pelo conjunto das grandes empresas listadas na B3, a Bolsa de Valores brasileira.

Principalmente aquelas beneficiadas pelo atual ciclo de alta das commodities — Petrobras, Vale, Suzano, JBS etc — e bancos, mas não só elas, registraram, em geral, recordes de lucros no primeiro trimestre de 2022. Nem por isso, diferentemente do que seria de se esperar em tempos normais, decidiram investir em ampliação ou modernização dos seus negócios.

Colunista da Folha, o jornalista Marcos Vasconcellos, fundador do site de análises e aplicações financeiras Monitor do Mercado, fornece detalhes sobre o fenômeno, em sua coluna desta segunda-feira (30). Em resumo, o autor mostra que os lucros estão crescendo mais do que o faturamento, enquanto o endividamento vem caindo, um indicativo de menos apostas no crescimento futuro das companhias,

Os lucros em conjunto das 350 empresas listadas na Bolsa, no primeiro trimestre de 2022, passaram de R$ 900 bilhões, avançando 44% sobre o resultado do primeiro trimestre de 2021. Na B3, das dez empresas com os maiores lucros no primeiro trimestre de 2022, nove reportaram resultados recordes. No mesmo período, o faturamento conjunto do grupo avançou 24%, pouco menos da metade do ritmo de expansão do lucro.

Chama ainda mais a atenção o fato de que, mesmo lucrando mais, as empresas estão se endividando menos. Quando decidem investir, empresas, sobretudo as de grande porte, reúnem recursos próprios e recorrem a financiamentos. No caso de empresas saudáveis e lucrativas, o endividamento costuma refletir uma aposta no crescimento do negócio, traduzida por planos de investimento na ampliação ou modernização da produção.

É relativamente comum observar redução no ritmo de investimento em anos de eleição presidencial. Sem certezas em relação à futura condução da política econômica, a tendência, nas empresas, é adotar estratégias defensivas, guardar forças e esperar definições mais claras no ambiente de negócios. Mas não é tão comum a decisão de distribuir mais lucros em detrimento de investimentos em crescimento futuro.

Há razões técnicas que explicam parte do crescimento além do normal nos lucros. Um deles é representado pela queda das despesas, sobretudo as financeiras, com o recuo da taxa de câmbio, no primeiro trimestre deste ano.

A elevação dos custos do crédito, com a alta das taxas de juros, de outro lado, pode ter contribuído para a queda no endividamento das grandes empresas. É possível localizar, de fato, uma piora acentuada nas condições financeiras. Mas a retração do endividamento vai além desse possível efeito.

Na comparação com os ganhos brutos antes dos juros, impostos e amortizações, a dívida líquida vem recuando. Sem considerar os dados de Petrobras e Vale, que, pelo volume, distorceriam a amostra, a dívida líquida, em 2015, seria paga com os lucros brutos em três anos. Em 2019, a relação já caíra para 2 anos, baixando agora, no primeiro trimestre de 2022, para 1,5 ano.

Endividamento menor, no curto prazo, como lembra Vasconcellos, significa custo financeiro menor. Custos menores explicam parte do aumento nos lucros. Mas, no médio prazo e, principalmente, a longo prazo, esse quadro é preocupante.

Expressa, de um modo geral, menos impulso para a atividade econômica e obstáculos na absorção de mão de obra, o que acaba desaguando em restrições de renda e de consumo. Pode significar também comprometimento futuro do negócio, com perda de competitividade e de capacidade de aproveitar um eventual ambiente favorável à retomada para reocupar espaços perdidos no mercado.

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