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No lixo, o rastro de 20 anos da presença dos EUA no Afeganistão

23/06/2021 10h00

Bagram, Afeganistão, 23 Jun 2021 (AFP) - Agachado na beira da estrada principal de Bagram, Mir Salam recolhe minúsculos pedaços de aparelhos eletrônicos. "Isso é o que os americanos fazem: destroem absolutamente tudo!", critica.

Este homem de 40 anos está cercado por telefones militares incompletos, teclados de computador quebrados, pneus estourados, o que restou de algumas impressoras e de outros materiais quase irreconhecíveis. Tudo de que as tropas americanas não precisam mais antes de deixar o país.

A poucos quilômetros de distância, o Exército dos Estados Unidos está deixando sua grande base aérea no Afeganistão, que foi alvo de vários ataques no passado, como parte de seu plano de retirada após 20 anos de presença militar.

Em 1º de junho, uma autoridade americana garantiu que a retirada levaria "20 dias".

Herdada da ocupação soviética, Bagram está localizada a cerca de 50 quilômetros de Cabul e será entregue às autoridades afegãs, depois de abrigar desde 2001 dezenas de milhares de soldados ocidentais e até mesmo uma prisão secreta.

- 2.800 recrutas -"Os preparativos para devolver totalmente" o controle da base às forças de segurança afegãs estão em andamento, diz o governador de Bagram, Lalah Shrin Raufi.

"Começamos a recrutar soldados", outros virão de outras províncias. Ao todo, 2.800 homens assumirão o comando.

"Vamos contratar quem atender aos critérios", acrescenta Raufi.

Ao deixar suas bases, o Exército americano faz uma limpeza completa. Tudo o que não podem levar, "eles queimam, ou explodem", relata Mir Salam, indignado.

"Claro que estou com raiva! Eles mataram nossos pais e nossos filhos nesta guerra. Nesta base, havia muitas coisas novas, havia material para reconstruir o Afeganistão 20 vezes. Mas destruíram tudo", acrescenta.

Ao seu lado, Mohamad Amin concorda. "Eles vieram reconstruir nosso país, mas agora destroem tudo. Poderiam ter-nos dado todo esse material", lamenta.

Os dois homens alugam por mil afeganes (US$ 12) ao mês um terreno em que vasculham os escombros em busca de metal e de peças boas para revender.

Outros hangares estão alinhados ao longo da estrada: alguns, igualmente precários; outros, guardados por homens armados. O de Hajji Noor Rahman, por exemplo, está protegido por uma impressionante porta de correr.

"Tudo o que está em bom estado, as pessoas compram", afirma.

- Milhares de empregos perdidos -No interior, em várias dezenas de metros quadrados, encontram-se empilhadas cadeiras de escritório, telas de televisão, pesos e outros instrumentos para fazer ginástica, material médico de primeiros socorros e até decorações de Natal.

Tudo o que faz parte do dia a dia de uma base militar, onde vivem jovens militares e oficiais.

Abdul Basir chegou com um amigo de Cabul e já encontrou seis portas de metal em bom estado que vão comprar.

Mais longe, um jovem resgata um par de botas mal gastas, e outro, um ursinho de pelúcia e uma minibola de rúgbi.

"A retirada das tropas americanas terá um impacto negativo na economia do país e na região de Bagram", teme o governador, admitindo seu pessimismo.

"Sua presença aqui empregou milhares de afegãos", do mecânico ao padeiro, explica.

"Já encontrei funcionários de uma empresa que fornecia alimentos para a base, e todos perderam o emprego", cita.

O governador garante, no entanto, que o plano para retomar o controle do local está pronto.

"Trabalhamos com a polícia, os militares e os NDS [serviços de Inteligência] para proteger a base e prevenir ataques inimigos", diz ele.

Porque os talibãs não estão longe, ressalta Hajji Noor Rahman, lembrando que, durante o mês do Ramadã, período de jejum e oração para os muçulmanos, os insurgentes atacaram uma patrulha do Exército na área.

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