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Eleições na Armênia, entre a revolta e a apatia

18/06/2021 17h37

Erevan, 18 Jun 2021 (AFP) - Três anos depois de uma revolução que trouxe esperança, o jovem armênio Artiom Muradian está farto. Como muitos ex-partidários do governo atual, ele votará na oposição nas eleições legislativas de domingo.

"Nossas esperanças se partiram", disse à AFP este vendedor de 24 anos na casa dos pais em Erevan, capital deste pequeno e pobre país do Cáucaso.

Esse jovem magro e de cabelos escuros costumava "confiar cegamente" no primeiro-ministro interino Nikol Pashinyan, um reformista e herói popular que chegou ao poder em 2018 em um levante pacífico pós-eleitoral de uma população cansada da corrupção de suas elites.

Mas a humilhante derrota militar frente ao Azerbaijão pelo controle de Nagorno Karabakh em 2020 mudou tudo para Artiom, que, assim como seu irmão e pai, esteve no front no final do ano passado para combater o inimigo histórico.

Pashinyan "falou muito, mas não pôde cumprir suas promessas e ainda por cima, perdeu nossas terras", diz o jovem.

Após seis semanas de combates que deixaram cerca de 6.000 mortos, a Armênia se viu forçada a ceder amplas zonas que controlava desde uma primeira guerra nos anos 1990, no entorno de Karabakh, uma região separatista do Azerbaijão com uma população majoritariamente armênia.

Esta derrota desencadeou uma crise política que obrigou o primeiro-ministro a convocar eleições legislativas antecipadas. Espera-se que a votação seja muito disputada, embora ele acredite que irá vencer.

No entanto, o conflito o fez perder muitos apoiadores, alguns dos quais inclusive se aproximaram da antiga classe dirigente, à qual odiavam até pouco tempo atrás e que Pashinyan tinha prometido expulsar.

- Volta das velhas elites? -Alisa Yailakhanian, uma designer de 24 anos, não consegue conter as lágrimas quando se fala da guerra porque vários de seus amigos, todos na casa dos 20 anos, morreram em Karabakh.

"Todo mundo perdeu alguém", soluça a jovem esguia e de cabelos compridos. "Deram nossa terra de presente!", lamenta.

Esta russa-armênia conta que em 2018, "cansada do velho poder", a vitória de Pashinyan a tinha deixado "feliz". "Precisávamos de uma mudança", diz.

Mas hoje, ela se sente "enganada". "Tudo foi um teatro. Votarei para que Pashinyan não vença", afirmou a jovem, que optou por apoiar o bloco do ex-presidente Robert Kocharian para "tirar o país do caos".

Seu partido agora está empatado com o de Pashinyan, segundo as pesquisas.

Ele "é de Karabakh e sabe o que é lutar por sua terra e seu povo. Pashinyan nem sequer fez o serviço militar", afirmou Alisa.

Mas para outros armênios, com ou sem derrota militar, o mais importante é impedir a volta da velha classe política acusada de ter saqueado o país.

"Não devemos permitir em absoluto a volta da velha classe", diz Asmik Zakarian, de 32 anos, que trabalha no comércio.

Ele votará em Pashinyan: "Confio nele quando diz que cortará a mão antes de roubar o pão do povo".

- Mais confiança -Diante dessa polarização, os temores de enfrentamentos entre os dois lados são reais, independentemente do resultado da votação de domingo.

"O povo restá revoltado e irá às ruas", disse Alisa.

Cerca de 20.000 pessoas se concentraram nesta sexta-feira na praça central de Erevan em apoio ao candidato opositor Kocharian, no último dia de campanha, constataram jornalistas da AFP.

Um número similar de partidários do atual premier também se reuniram no mesmo local na quinta-feira.

No entanto, segundo uma pesquisa recente, mais de um terço dos armênios, esgotados com a crise, pensam em se abster no domingo.

Entre eles está Aram Petrosian, um professor de xadrez de 62 anos. "Não quero que voltem a nos enganar", disse à AFP durante uma reunião na biblioteca nacional em homenagem aos soldados assassinados.

Seu filho lutou em Karabakh e um genro morreu ali em outubro, deixando dos filhos sem pai. A família não tinha recuperado seus restos mortais até janeiro.

"O povo não confia mais em ninguém. O que vimos de bom em 30 anos de independência?", pergunta-se.

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