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Pfizer: Governo reclama até de gelo seco e soro fisiológico, diz professor

Vacina da Pfizer/BioNTech já é aplicada nos EUA, Canadá e Europa - Divulgação
Vacina da Pfizer/BioNTech já é aplicada nos EUA, Canadá e Europa Imagem: Divulgação
do UOL

Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

24/01/2021 11h13

Ao rejeitar a vacina contra a covid-19 desenvolvida pela Pfizer-BioNTech em nota divulgada ontem (23), o governo federal reclamou até do gelo seco e do soro fisiológico que a farmacêutica não ofereceria no contrato sugerido ao governo. Quem aponta para o que chama de "cereja do bolo" no comunicado governamental é o doutor em economia e professor do Insper (Ensino Superior em Negócios, Direito e Engenharia) Thomas Conti.

O professor decidiu destrinchar no Twitter a nota em que o Planalto justifica as razões para rejeitar a vacina. A "cereja do bolo", disse, foi o governo elencar entre os motivos para não comprar o imunizante o fato de que "o laboratório não disponibiliza o diluente para cada dose".

"Fui verificar no manual da vacina e o diluente é soro fisiológico comum!", escreveu o professor.

Na mesma toada de não comprar vacina porque não quer fornecer soro fisiológico, o governo também coloca como impedimento a reposição de gelo seco"
Thomas Conti, professor do Insper

"Pfizer-BioNTech inventam vacina para vírus novo em 6 meses e vocês não conseguem fazer gelo seco em 12 meses", disse. "Enfia a cara num buraco."

Ao UOL, o professor disse que o governo não foi preciosista em seu comunicado "porque eles não chamam o soro fisiológico de soro fisiológico". "Chamam apenas de 'diluente', e o leitor é induzido a achar que é algo caro e difícil de conseguir."

Tomo como provável que a nota foi direcionada aos apoiadores do governo. Ou no mínimo para um público muito leigo que teria dificuldade de ver os problemas claros da nota
Thomas Conti, professor do Insper

O professor disse ainda que o governo "mentiu" sobre outros temas. Veja a opinião de Conti sobre alguns deles:

  • Governo alega que as poucas doses do acordo da Pfizer frustraria os Brasileiros, "pois teríamos que escolher num país cotinental (...) quem seriam os eleitos a receberem". A proposta informada menciona 500 mil doses em grupos prioritários no ano passado e 2 milhões no começo do ano.

"Bem, é óbvio que sem acordo teremos ainda menos doses", rebateu Conti. "É ridículo acharem que isso é motivo razoável."

  • O governo citou "cláusulas abusivas" que obrigariam o Brasil a renunciàr "à soberania no exterior" em benefício da Pfizer, como o pedido para o país montar um fundo como garantia de pagamento.

Segundo o economista o "fundo garantidor e formas internacionais de pagamento e resolução de disputas estão sendo feitas pelo mundo todo". "Até União Europeia precisou de fundo garantidor e financeiras, imagina Brasil. Normal. O tom nacionalista da nota faz parecer extraordinário."

  • Governo diz que não fez acordo com a Pfizer-BioNTech porque já tinha acordo com Butantan.

"Aqui talvez a parte mais mentirosa de todas", dispara Conti: "Mas ele não tinha acordo com Butantan em junho, nem setembro, nem outubro. Até ontem ainda não pagou R$ 1 ao Butantan! Uma farsa."

  • De acordo com a nota governamental, "em todas as tratativas, aguardamos um posicionamento diferente do laboratório que contemple uma entrega viável e satisfatória, atendendo as estratégias do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19".

"As negociações com a Pfizer começaram em junho", lembra o economista. "Não faz sentido dizer que lá atrás a oferta era incompatível com um plano que nem existia."

Fico preocupado que essa nota, que além de declarar oficialmente incompetência do governo nos acordos de vacina, também é péssima sinalização para futuras negociações. Quem vai negociar com alguém sem disposição a ser razoável, mas que está disposto a mentir publicamente nessa escala?"
Thomas Conti, professor do Insper

Para o professor, "o governo fez uma opção consciente de não comprar essa vacina". "Os motivos podemos apenas especular."

"Não me parece que houve da parte do governo qualquer prioridade para a compra de vacinas e criação do PNI, haja vista a quantidade de atrasos, imprevistos e o baixo número de doses que temos disponíveis", disse ao UOL. "Como a escolha de não comprar foi claramente equivocada, agora estão sendo cobrados por isso e não querem assumir o ônus político. Estão tentando desviar a culpa para a Pfizer sem apresentar argumentos razoáveis", diz.

Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até a publicação.

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