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Novo recorde de desmatamento reflete ineficiência de operação militar do governo

03/12/2020 12h48

Novos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (INPE) nesta semana indicaram que, no último ano, o Brasil registrou, pela segunda vez consecutiva, o maior desmatamento da Amazônia desde 2008. Os números refletem a ineficiência da operação militar promovida pelo governo federal para combater o problema - uma solução criticada, desde o início, pelos ambientalistas e cientistas especialistas no problema.

O sistema de monitoramento Prodes, do INPE, identificou uma alta de 9,5% da devastação das florestas entre agosto de 2019 e julho de 2020, em relação ao período anterior, num total de 11.088 km². Isso significa que uma área quase nove vezes maior que a cidade do Rio de Janeiro foi destruída em um ano.

De 2018 para 2019, o aumento do desmatamento já tinha sido de impressionantes 43%. A operação militar Brasil Verde começou em meados do ano passado, durante o período da seca na Amazônia, quando acontece o pico dos incêndios.

A medida se repete neste ano, mas os recordes de desmatamento permanecem, constata Gilberto Câmara, ex-diretor do INPE, de 2005 a 2012. Atualmente, ele está à frente do Grupo de Observação da Terra, ligado à ONU, em Genebra.

"O governo colocou um general e, supostamente, toda a infraestrutura militar para combater o desmatamento, e só piorou. Isso significa que tudo é uma fachada. Não há capacidade ou interesse real do governo em combater", resume o especialista.

Desmatamento não é "crime de polícia"

Câmara ressalta que o desmatamento ilegal não pode ser combatido como um delito comum, pela força policial ou militar. Trata-se de um crime complexo, baseado no desrespeito à legislação de proteção ambiental em um território imenso.

"O que está acontecendo é que o governo Bolsonaro sinalizou para os desmatadores que eles podem fazer porque ele vai perdoar. Que se houver multa, ela será perdoada. Que se os equipamentos deles [para desmatar] forem apreendidos, ele vai liberar de volta. O crime compensa", sublinha o cientista.

Para ele, a opção de dar às Forças Armadas a responsabilidade de controlar a devastação é uma escolha política, para agradar a ala militar que integra o governo. "É como num sistema de saúde. Se tem uma doença, você não pode só mandar um monte de médicos. Você precisa deles, mas também de um hospital, uma clínica. Precisa conhecer a região", compara. "Com o desmatamento é a mesma coisa: os técnicos precisam estar lá, saber o que está acontecendo, conhecer o mercado de madeira, de carne, de soja. Tem que saber quem está fazendo isso e por quê."

Floresta densa ameaçada

Os números mais recentes também revelaram que o desmatamento no Amazonas, onde a floresta é mais densa, está semelhante ao verificado no Mato Grosso, tradicionalmente explorado pelo agronegócio. Os dados indicam um avanço perigoso da destruição na direção do coração da Amazônia, o que pode significar um processo irreversível de savanização do bioma, se essa tendência permanecer.

Gilberto Câmara frisa que, nos últimos anos, o apetite dos pecuaristas desperta uma especulação imobiliária inédita na região. "O grande desafio não é saber o que está causando o desmatamento - isso está mais do que claro. É estabelecer mecanismos de controle que, se o governo quisesse, faria", explica. "Colocaria chips para a rastreabilidade da carne, verificaria a localização do gado. Tudo isso é factível, mesmo num país como o Brasil. Ele não quer fazer", pontua.

O Observatório do Clima, que reúne 56 entidades ambientais, lembra que o Brasil descumpriu sua Política Nacional de Clima, que previa um máximo de 3.925 km² de destruição das florestas em 2020. "O país está 180% acima da meta", afirmou o observatório, em nota. Os índices atuais de desmatamento distanciam o país dos compromissos assumidos no Acordo de Paris sobre o Clima, assinado em 2015.

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