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Valery Giscard d'Estaing, o presidente que trouxe renovação para a França

02/12/2020 21h50

Paris, 3 dez 2020 (AFP) - O ex-presidente Valery Giscard d'Estaing, que faleceu aos 94 anos na noite desta quarta-feira (2) em consequência da covid-19, trouxe ventos de mudança para a política francesa e rompeu com o conservadorismo dominante depois da Segunda Guerra Mundial.

Eleito presidente aos 48 anos, o líder centrista, conhecido pela maioria dos franceses simplesmente como Giscard ou VGE, empreendeu rapidamente uma série de reformas radicais: legalizou o aborto, liberalizou o divórcio e reduziu a 18 anos a idade para votar.

Quando eleito, em 1974, para um mandato de sete anos, Giscard d'Estaing foi o presidente mais jovem do país e trouxe consigo um estilo inédito para a época, mais descontraído do que o de seus antecessores, Charles de Gaulle e Georges Pompidou.

Era visto em público jogando futebol ou tocando acordeão; também recebia os funcionários da coleta de lixo para tomar café-da-manhã e convidava para jantar em casa cidadãos comuns.

Era adepto do liberalismo econômico, um pró-europeu convicto e defensor de uma integração maior.

Foi por iniciativa dele que os líderes dos países mais ricos do mundo se reuniram pela primeira vez em 1975, em um evento embrionário da cúpula do G7.

- Elite francesa -Nascido em uma família abastada em 2 de fevereiro de 1926, Valery Giscard d'Estaing fazia parte da elite francesa.

Alto e esbelto, com um estilo elegante e aristocrático, estudou nas prestigiosas Escola Politécnica da França e na Escola Nacional de Administração.

Como soldado, participou da libertação de Paris durante a Segunda Guerra Mundial, que pôs fim à ocupação nazista, em 1944, e depois serviu durante oito meses na Alemanha e na Áustria, no período prévio à capitulação do Terceiro Reich.

Entrou para a política em 1959 e em 1969 assumiu o comando do ministério das Finanças.

Em 1966, fundou o Partido Republicano Independente, que com o tempo se tornou a União para a Democracia Francesa (UDF), uma formação de partidos de centro-direita.

Tornou-se o líder da centro-direita no período prévio à sua eleição, em 1974.

Durante seus sete anos no poder, Giscard lançou projetos de modernização de infraestrutura de grande alcance, como o trem de alta velocidade TGV, e comprometeu a França com a energia nuclear.

Também forjou uma poderosa aliança franco-alemã com o chanceler social-democrata Helmut Schmidt, com quem encabeçou a União Econômica e Monetária Europeia que estabeleceu as bases para a moeda única.

- O escândalo do diamante -Mas seu mandato também foi atingido pela crise do petróleo da década de 1970, o aumento do desemprego e da inflação.

Sua reputação foi abalada por afirmações em 1979 de que teria recebido diamantes pessoalmente, quando era ministro das Finanças, do ditador da República Centro-africana Jean-Bedel Bokassa.

Apesar de tê-lo desmentido, o escândalo ofuscou sua candidatura a um segundo mandato, que perdeu para o socialista François Mitterrand em 1981 por mais de um milhão de votos.

Foi um golpe para Giscard, que escreveu em 2006: "O que eu sinto não é uma humilhação, mas algo mais grave: frustração com um trabalho inacabado". No entanto, permaneceu ativo na política e se elegeu para o Parlamento francês.

Também foi deputado europeu (1989-1993) e em 2001 foi selecionado pelos líderes europeus para dirigir os trabalhos sobre o tratado constitucional do bloco, que foi rejeitado por 55% dos eleitores franceses.

Em 2004, após perder o assento no Legislativo, pôs fim à sua carreira política.

Ao se aposentar, desenvolveu grande inclinação por escrever romances picantes, entre eles "A princesa e o presidente", no qual imagina um idílio com a falecida princesa Diana de Gales.

Em 2003, tornou-se o primeiro ex-chefe de Estado nomeado para a Academia Francesa, reservada à elite literária do país.

Foi alvo, em maio passado, de uma investigação por suposta agressão sexual, depois que uma jornalista alemã se queixou de que ele a teria tocado nas nádegas durante uma entrevista. O ex-presidente devia depor aos investigadores nas próximas semanas.

Após ser hospitalizado várias vezes recentemente, "seu estado de saúde tinha se deteriorado e falecido em consequência da covid-19", informou sua família à AFP, especificando que o funeral será celebrado "na mais estrita intimidade familiar".

"Valéry Giscard d'Estaing trabalhou toda a sua vida para estreitar os laços entre as nações europeias, quis e conseguiu modernizar a vida política e dedicou sua grande inteligência à análise das problemáticas internacionais mais complexas", disse o ex-presidente Nicolas Sarkozy, homenageando-o nas redes sociais.

A França "perde um estadista que optou por se abrir para o mundo", lamentou outro ex-presidente, o socialista François Hollande.

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