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Estudo avalia como sistema imunológico reage após infecção pelo coronavírus

07/07/2020 05h10

A contaminação pela Covid-19 protege contra uma nova infecção? Essa questão crucial está no centro da pesquisa realizada pela equipe do imunologista francês Simon Fillatreau, que iniciou um estudo há algumas semanas no hospital Necker e no Instituto Necker Enfants Malades (INEM), em Paris. A ideia é caracterizar e quantificar células que "memorizam" a contaminação.

A equipe do pesquisador francês, formada pelos pesquisadores Jean-Claude Weill, Claude-Agnès Reynaud e Matthieu Mahévas se concentra nos linfócitos B, que fabricam os anticorpos, e nas células T CD4, ou linfócitos auxiliares, que coordenam o sistema imunológico do organismo quando ele é atacado por vírus, bactérias ou fungos. Eles estimulam as defesas se conectando diretamente às células B, ativando a imunidade humoral, que pode ser transmitida pelo plasma ou soro - uma das pistas para tratar a Covid-19.

Para entender a "memória" que o corpo guarda depois da contaminação pela Covid-19, o professor Fillatreau selecionou 30 pacientes para analisar o que sistema imunológico deles registrou depois da infecção um, três e seis meses depois da cura. Os participantes não tinham patologias graves, já que o objetivo do estudo é entender a formação e a persistência da memória imunitária nas células B e T, e não os fatores preditivos que levariam a uma eventual hospitalização na UTI, explica Fillatreau.

"A vida dessas células de memória imunitária, como a B, é muito variável em função da infecção e da vacinação utilizada. Ainda não sabemos o que fazem as células persistir muito tempo, a vida inteira de um indivíduo, ou apenas alguns meses ou anos. Mas podemos estimar isso indiretamente observando a persistência dos anticorpos do vírus no sangue dos pacientes", explica.

Os cientistas ainda não sabem quanto tempo os anticorpos fabricados pelo corpo contra a Covid-19 protegem o indivíduo, mas há outros elementos da chamada memória imunológica que podem ajudar a proteger quem já foi contaminado por uma nova infecção. "Esta memória linfocitária é acionada rapidamente no caso de uma segunda infecção e gera a chamada memória reativa, que cria anticorpos depois de uma segunda contaminação", explica.

Essa memória reativa inclui o registro das células B, que persiste após a primeira infecção, explica o cientista. Elas não produzem anticorpos, mas serão ativadas e vão se proliferar mais rapidamente, diz, do que em alguém que nunca teve contato com o vírus. Elas ajudam a aumentar a produção de antígenos em poucos dias, levando consequentemente a uma alta da produção de anticorpos. De certa forma, o processo pode ser comparado à dose de reforço de uma vacina. Os linfócitos T CD4+ e os linfócitos B atuam juntos para que o indivíduo resista a uma nova contaminação.

O estudo começou há poucas semanas, mas as ferramentas desenvolvidas pela equipe, que identificam a presença de anticorpos no sangue dos pacientes, e as células da memória imunológica, já poderiam ser compartilhadas com profissionais de outros países como o Brasil, por exemplo, onde a transmissão da Covid-19 está fora de controle.

O imunologista também lembra que ainda não existem provas sobre a existência de uma imunidade cruzada contra a SARS-Cov-2, que protegeria os indivíduos. Por isso, é preciso que as medidas de proteção, como uso de máscaras e distanciamento social, sejam perenes na ausência de um tratamento específico ou vacina.

Formas graves ainda são uma incógnita

Simon Fillatreau lembra que os médicos ainda não sabem porque algumas pessoas vão desenvolver formas graves da Covid-19 e isso continua sendo um dos principais desafios dos pesquisadores. Na França, ressalta, os estudos mostram que as crianças são menos afetadas do que os idosos, por exemplo.

A obesidade também provocaria mudanças metabólicas que facilitariam a temida síndrome inflamatória que pode ser desencadeada depois da infecção. Sem contar outros fatores de risco, como as doenças cardíacas ou respiratórias. "Acredito que estamos apenas no início das descobertas que nos levarão a entender o que leva a uma forma severa da doença, que pode também ser diferente de um lugar para o outro", nota.

Ele cita como exemplo o bairro de Seine Saint-Denis, na região parisiense, onde foram registrados casos mais graves do que em outros lugares. O motivo que leva algumas crianças contaminadas a desenvolver a doença de Kawasaki que provoca uma inflamação dos vasos sanguíneos, também continua sendo um mistério. "Não entendemos ainda porque algumas crianças desenvolvem a doença de Kawasaki, e outras não, depois de uma contaminação pela SARS-Cov-2", explica.

Outros estudos acontecem simultaneamente no hospital que ajudarão a entender o funcionamento da Covid-19. Uma outra equipe, coordenada pela pesquisadora Isabelle Sermet, no hospital Necker e no Instituto Necker Enfants Malades (INEM), realiza outra pesquisa para comparar adultos e crianças da mesma família e entender porque elas estariam mais protegidas contra o vírus depois da infecção.

Outro estudo no hospital francês também analisa o caso dos assintomáticos, que se contaminam sem ficar doentes. As equipes trabalham juntas para entender todos os aspectos imunológicos da Covid-19 e destrinchar seus mistérios.

Cooperação internacional

Fillatreau lembra também que a cooperação internacional no caso da pandemia é fundamental para esclarecer a fisiopatologia da Covid-19, que em princípio é um vírus que normalmente sofre poucas mutações, diferentemente do da gripe ou do HIV, por exemplo.

Essa hipótese, entretanto, não pode ser totalmente descartada. Em relação ao coronavírus, lembra o imunologista, é difícil prever o que vai acontecer. "Só posso encorajar as pessoas a se protegerem como podem, usando máscaras e adotando a distância social, principalmente porque desconhecemos todos os fatores de risco para as formas graves", alerta.

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