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Minneapolis e suas 'feridas ocultas'

03/06/2020 15h22

Minneapolis, Estados Unidos, 3 Jun 2020 (AFP) - Minneapolis é citada frequentemente como a "Pequena Maçã", porque, como Nova York, é diversa, viva e moderna. Mas com a morte de George Floyd, a metrópole do norte dos Estados Unidos se vê confrontada com a dura realidade de suas desigualdades raciais profundas.

"É muito triste que tenha acontecido em Minneapolis, porque é bela", lamenta Rick Curran, septuagenário, branco, que vive na cidade há mais de 30 anos.

A cidade do cantor Prince, localizada no estado de Minnesota, é conhecida por seu cenário musical dinâmico, suas ciclovias, sua boa acolhida aos estrangeiros e seu progressismo: de seus 13 vereadores, 12 são democratas, incluindo duas pessoas transgênero e negras e um ambientalista.

"Temos os lagos, as pessoas parecem ser abertas... mas temos feridas ocultas", diz Curran, ex-garçom. Estas feridas se tornaram evidentes para o mundo em 25 de maio, quando uma jovem transmitiu ao vivo pela internet a morte de George Floyd, 46, negro, asfixiado por um policial.

Em 2015, a cidade, de 430 mil habitantes, 20% deles negros, também foi cenário de manifestações, após a morte de Jamar Clark, jovem negro assassinado a tiros durante sua prisão.

- 'Por fora' - Para muitos, estes eventos não são casos isolados, e sim provêm da cultura "racista" impregnada nas forças policiais da cidade. "É um sistema que funciona exatamente como foi pensado. Infelizmente, isto significa que foi idealizado para excluir alguns", disse ontem o governador de Minnesota, Tim Walz, ao anunciar uma investigação sobre as práticas policiais em Minneapolis nos últimos 10 anos.

A polícia não é a única acusada. "Por fora, parecemos muito progressistas, mas há muito racismo e opressão institucional, por exemplo, nas políticas habitacionais", comenta o trabalhador social Teyler Geisen, 28.

Leis aprovadas no começo do século XX proibiram os negros de comprar terras em certas áreas da cidade. Os bancos e agentes imobiliários perpetuaram esta discriminação, segundo o projeto "Mapping Prejudice", que estudou as cláusulas de milhares de contratos.

Em 2018, o município aprovou uma reforma para ajudar os moradores negros a terem acesso a propriedades nos bairros de maioria branca, mas a situação ainda não mudou.

- 'Todos ajudam' -"Minnesota é um dos estados com maior nível de segregação nos Estados Unidos, o que as pessoas de fora não sabem, porque ele está no norte e vota nos democratas", explica Alexandra Artavia, 28, referindo-se à divisão entre os estados partidários da escravidão (os do sul) e os abolicionistas (os do norte) durante a guerra civil.

Como em outras partes do país, a população negra também é mais pobre: 28% dos lares negros do estado vivem abaixo da linha de pobreza, frente a 7,2% dos lares brancos, segundo o Departamento de Saúde de Minnesota.

No último domingo, Alexandra Artavia doou alimentos a uma igreja negra para ajudar as famílias pobres e pequenas empresas a enfrentar a crise causada pela pandemia e pelas noites de distúrbios. Assim como ela, milhares de moradores de Minneapolis se mobilizaram, participando de coletas em estacionamentos, igrejas, centros comunitários ou através da internet.

Durante as manifestações, brancos e negros se uniram para pedir o fim da violência policial e das desigualdades. Esta solidariedade tocou o coração de Jimmy Branco, negro, 32, que, há uma semana, dorme no local do drama, transformado em ponto de contemplação e homenagens a George Floyd. "Todos ajudam todos, ninguém fica de fora. Nunca me sentir melhor nos Estados Unidos", afirma.

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