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Covid mata 55% dos negros e 38% dos brancos internados no país, diz estudo

Imagem de uma Unidade de Terapia Intensiva durante pandemia da covid-19 em São Paulo - Edu Cavalcanti/UOL
Imagem de uma Unidade de Terapia Intensiva durante pandemia da covid-19 em São Paulo Imagem: Edu Cavalcanti/UOL
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Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

02/06/2020 13h09

Mais da metade dos negros que se internaram em hospitais no Brasil para tratar casos de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave), com confirmação de covid-19, morreu.

Esta é a constatação de uma nota técnica assinada por 14 pesquisadores do NOIS (Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde) da Puc (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro, em que foram analisados 29.933 "casos encerrados" de covid-19 (ou seja, com óbito ou recuperação). Dos 8.963 pacientes negros internados, 54,8% morreram nos hospitais. Entre os 9.988 brancos, a taxa de letalidade foi de 37,9%.

O estudo foi feito com base nos dados divulgados pelo Ministério da Saúde até o dia 18 de maio. Há também indígenas (54 internados, sendo 38 óbitos) e amarelos (305 internados, com 146 óbitos); 10,6 mil pessoas tiveram a raça ignorada ou não preenchida no momento da internação.

A maior diferença ocorre entre pessoas de 30 a 39 anos, em que negros têm 2,5 vezes mais chances de morrer em uma internação por SRAG do que brancos internados. Entre idosos com mais de 90 anos, a diferença de mortalidade é a menor: apenas 5% a mais entre negros.

Para Silvio Hamacher, coordenador do NOIS, há duas hipóteses que podem ajudar a explicar essa diferença de letalidade: "questões biológicas ou ambientais e socioeconômicas", diz o pesquisador.

"Nós acreditamos que a segunda hipótese é prevalente, mas as questões biológicas também podem responder por uma parcela do excesso da letalidade de pardos e pretos. Nossa opinião é corroborada por alguns estudos científicos", afirma Hamacher, citando um artigo publicado na revista científica The Lancet, intitulado "Aprimorando o foco global em etnia e raça na época da covid-19".

Para a doutora em Saúde Pública e professora e pesquisadora da UFBA (Universidade Federal da Bahia), Emanuelle Góes, vários contextos contribuem para que o novo coronavírus seja mais letal entre negros. "Negras e negros sofrem o impacto do racismo estrutural, e com isso apresentam os piores indicadores sociais e de saúde. Neste sentido o cenário já é desfavorável", explica.

Outro dado que chama a atenção na pesquisa é que, entre os brancos, somente a partir dos 70 anos é que a internação por covid-19 resulta em mais mortes do que cura dos pacientes. Entre os negros, isso ocorre já a partir dos 60 anos.

Escolaridade e IDH

Hamacher pondera que a pesquisa também fez análises conforme outros subtipos, como escolaridade da pessoa e IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do município onde foi internada.

"As chances de morte pela covid-19 em hospitais em municípios de IDH médio é de 64,3%, enquanto que nos municípios com o IDH mais elevado cai para 32,9%. A diferença é ainda maior em relação à escolaridade: as chances de morte para uma pessoa sem escolaridade [71,3%] são quase três vezes maiores que para pacientes com nível superior [22,5%]", explica.

De acordo com a nota técnica publicada pela PUC-Rio, pretos e pardos apresentaram maior percentagem de óbitos em relação aos brancos em todos os níveis de escolaridade. "Pretos e pardos sem escolaridade mostraram uma proporção quatro vezes maior de morte do que brancos com nível superior (80,35% contra 19,65%)."

"Infelizmente, [a pesquisa] confirma o que já sabemos: a desigualdade social tem impacto direto nos óbitos entre os mais pobres e com menor escolaridade", comenta Hamacher.

A doutora Góes argumenta que pretos e pardos estão mais expostos, o que contribui para maior letalidade. "Eles são maioria no mercado informal e no trabalho de serviços gerais e domésticos. A população negra também apresenta as maiores proporções de doenças do grupo de risco, a exemplo da diabetes e da hipertensão", finaliza.

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