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Conflitos mundiais continuam apesar da pandemia de Covid-19, alerta ONU

29/05/2020 16h43

Desde meados de março a Organização das Nações Unidas (ONU) tenta negociar uma trégua nos conflitos pelo mundo, pelo menos durante a pandemia de Covid-19. Alguns grupos armados se mostraram favoráveis ao cessar-fogo temporário e uma resolução chegou a ser apresentada diante do Conselho de Segurança da ONU. Mas o texto não foi ratificado, principalmente por causa da queda de braço entre China e Estados Unidos.

Com informações de Nicolas Falez

O pedido de trégua foi lançado em 23 de março pelo secretário-geral das ONU, Antonio Guterres. "É preciso pressionar os atores da guerra para que eles entendam que nosso inimigo é o vírus, e não os homens e mulheres e vivem nas zonas de conflito", declarou o português em entrevista conjunta à RFI e ao canal de televisão France 24. No entanto, quando o apelo foi feito, o chefe da ONU já sabia que a proposta era ambiciosa. "É possível que seja um fracasso, mas faremos tudo para evitar isso", declarou.

Dois meses depois, Guterres reconhece a ausência de progresso sobre o assunto. Não por falta de vontade dos principais interessados, pois vários Estados em guerra e grupos armados demonstraram seu apoio à ideia de uma trégua. Um grupo separatista de Camarões propôs um cessar-fogo no final de março e a coalizão militar dirigida pela Arábia Saudita e que intervém no Iêmen chegou à respeitar um pacto temporário de paz no início de abril.

O principal impasse é no âmbito das negociações na própria Organização das Nações Unidas. A entidade propôs uma resolução sobre o cessar-fogo a partir de um projeto elaborado pela França e a Tunísia. Mas o texto nunca foi aprovado. O principal obstáculo é a queda de braço entre Estados Unidos e China, que se recusam a ratificar o texto e bloqueiam o processo.

Menção da OMS opõe Estados Unidos e China

A relação entre as duas potências mundiais é tensa em vários assuntos. E no caso da ONU, o impasse está na menção da Organização Mundial da Saúde (OMS) no texto da resolução. Washington está suspendendo o financiamento da OMS e não tolera que a agência da ONU seja citada no texto. Do lado de Pequim, a exigência dos norte-americanos é inaceitável. Resultado:  o processo segue bloqueado.

"Ver dois países que não chegam a um acordo sobre uma resolução tão simples ilustra a degradação das relações entre eles", comenta Robert Malley, que foi conselheiro dos ex-presidentes norte-americanos Bill Clinton e Barack Obama e atualmente dirige a International Crisis Group (ICG), uma ONG que atua na prevenção de conflitos. A ICG e outras organizações publicaram um comunicado conjunto no qual classificam de "vergonhosa" essa paralisia do Conselho de Segurança da ONU, principalmente nesse momento de crise sanitária mundial.  

Para Alexandra Novosseloff, pesquisadora do centro de análises e pesquisas em relações internacionais Thucydide da Universidade Paris II, esse impasse mostra que o Conselho de Segurança continua se baseando em critérios "do passado", mesmo se o assunto agora é encontrar uma solução para o futuro, no mundo pós-pandemia. "Isso tudo nos lembra que a ONU é uma organização de Estados. Se eles não conseguem chegar a um acordo, a ONU como órgão coletivo não pode existir". Especialista nas Nações Unidas, a pesquisadora insiste que "o Conselho de Segurança é um centro político-securitário, que não pode funcionar se os grandes Estados estiverem completamente divididos".

Na quinta-feira (28), cerca de 50 dirigentes do mundo todo, reunidos em uma videoconferência organização pela ONU para discutir o financiamento do desenvolvimento global, pediram mais "resiliência" e "cooperação" no mundo pós-pandemia. Estados Unidos, Rússia e China não participaram do encontro.

"Diante de uma crise do multilateralismo, é preciso que os Estados e principalmente os membros do Conselho de Segurança se unam para adotar respostas conjuntas", insiste Chloé Maurel, doutora em história e especialista nas Nações Unidas. Para ela, a união é indispensável, principalmente porque "essa crise é tem várias formas e vai afetar questões alimentares e sociais, com o aumento do desemprego. E todas as agências da ONU, como a OMS para a saúde, a FAO para a alimentação, a Unesco para a educação, a OIT para o trabalho e a ACNUR para os refugiados, têm um papel determinante".

 

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