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China será mais forte no cenário mundial pós-Covid-19, diz secretário do Idea

08/04/2020 04h38

Miami, 8 abr (EFE).- O secretário-geral da organização intergovernamental Instituto Internacional para Democracia e Assistência Eleitoral (Idea International), Kevin Casas-Zamora, acredita que a China se tornará a principal potência no mundo pós-Covid-19, superando os Estados Unidos, e que isso representará uma ameaça aos sistemas democráticos.

"Quando a poeira da pandemia assentar, veremos a China emergir como o ator mais poderoso do cenário mundial", disse Casas-Zamora, que também foi vice-presidente e ministro do Planejamento da Costa Rica, em entrevista à Agência Efe.

"Esta não é uma boa notícia para os defensores do avanço da democracia", destacou.

ESTADOS UNIDOS E UNIÃO EUROPEIA EM XEQUE.

Para Casas-Zamora, que desde agosto de 2019 está à frente do Idea International, o novo coronavírus vai produzir mudanças geopolíticas significativas.

A possibilidade de a China se tornar a principal potência mundial representará um revés para a democracia, pois se este sistema se espalhou, de acordo com ele, é em parte porque os Estados Unidos promoveram seus valores em todo o mundo, diz Casas-Zamora.

Entretanto, além do acesso precário ao sistema de saúde nos EUA, desta vez houve uma resposta do governo federal à pandemia que, "de alguma forma, mostrou que o imperador foi deixado nu".

Quanto à União Europeia, a incapacidade de ter uma reação comum à Covid-19 levanta "questões desconfortáveis" sobre o futuro do bloco, opinou o secretário-geral do Idea International.

A organização intergovernamental de 25 anos, com sede em Estocolmo, conta com 33 países membros, entre eles Brasil, Chile, Costa Rica, República Dominicana, México, Panamá, Peru e Uruguai, e tem programas de pesquisa e assistência técnica em mais de 70.

RISCOS PARA A DEMOCRACIA E AS LIBERDADES.

"Há riscos consideráveis para a democracia" na crise gerada pelo novo coronavírus, ressaltou Casas-Zamora, que acredita que os efeitos dela só são comparáveis aos de uma guerra mundial.

Entre os riscos imediatos, ele citou a possibilidade de os "poderes especiais" que os governos têm diante de uma situação excepcional possam se tornar "o novo normal", algo não só exigido por governantes "autoritários", mas também tolerado por uma "multidão assustada".

Outro risco muito próximo é o da "invasão da esfera privada" do cidadão sob o pretexto de monitorar o cumprimento do distanciamento social e outras medidas para evitar o contágio.

Os riscos ou consequências a longo prazo são "muito mais complexos" e têm a ver, entre outros aspectos com a manutenção da ordem pública em meio à crise econômica resultante da pandemia e com o respeito ou não ao calendário eleitoral, comentou Casas-Zamora.

AMÉRICA LATINA E A ENCRUZILHADA.

O secretário-geral do Idea International mostrou-se particularmente preocupado com as eleições na Bolívia e na República Dominicana, cujas próximas eleições ele considera "muito controversas".

Para Casas-Zamora, as eleições presidenciais nos dois países acabarão sendo adiadas, e isso vai acrescentar "combustível para duas situações muito voláteis".

É preciso perguntar o que vai acontecer quando os atuais presidentes terminarem seus mandatos e seus sucessores não forem eleitos. "Vejam o caso da Bolívia, onde a presidente em exercício é candidata", frisou.

Nos casos de Venezuela, Cuba e Nicarágua, Casas-Zamora considera difícil fazer previsões, e é por isso que não pode dizer se o povo vai se levantar para mudar seus regimes políticos.

Na Venezuela, com um sistema de saúde que "já entrou em colapso", a "válvula de escape" que o governo utilizou para o êxodo de milhões de pessoas pode se perder sob as atuais restrições de movimentação em meio ao isolamento geral.

Em Cuba, onde o sistema de saúde tem pelo menos "uma capacidade instalada", a economia será muito afetada pela forte queda do turismo internacional.

TEMPO DE REPENSAR O CONTRATO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA.

Casas-Zamora também acredita que a crise econômica resultante da Covid-19 vai forçar a América Latina a "repensar o contrato social".

A questão principal é se todos os países têm os mecanismos de diálogo político e social necessários para iniciar uma discussão "extraordinariamente complexa" sobre como garantir que os Estados fortemente endividados mantenham a capacidade de fazer os investimentos necessários para "preservar a paz social".

Na opinião do secretário-geral do Idea, o Chile tem uma grande oportunidade de se engajar em tal discussão no processo de reforma constitucional em curso.

TEMPESTADE PERFEITA NAS TENDÊNCIAS POLÍTICAS.

Casas-Zamora acredita que, nos países democráticos, os governantes que tiveram que gerenciar esta crise, independente da linha política que sigam, "terão dificuldades" em futuras eleições.

Aqueles que tentam renovar seus mandatos terão dificuldades, destacou o secretário-geral.

"Em situações que geram muita incerteza, aumenta o impulso dos cidadãos em buscar refúgio em figuras autoritárias para buscar o abraço paternal", disse.

"Digo paternal porque eles são sempre homens", acrescentou.

Crises como a do novo coronavírus também geram uma rejeição à globalização e, portanto, aumentam a atração de "populistas com discursos de essência nacionalista e autoritária".

"É uma tempestade perfeita", concluiu.

Ana Mengotti.

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