Topo
Notícias

Mortes suspeitas na região Sudeste superam total oficial de vítimas no país

Coveiros foram treinados para fazer sepultamentos de vítimas fatais do coronavírus em cemitério do Rio de Janeiro - Herculano Barreto Filho/UOL
Coveiros foram treinados para fazer sepultamentos de vítimas fatais do coronavírus em cemitério do Rio de Janeiro Imagem: Herculano Barreto Filho/UOL
do UOL

Herculano Barreto Filho e Rodrigo Mattos

Do UOL, no Rio de Janeiro

02/04/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Região Sudeste tem 295 casos de mortes suspeitas por covid-19 que ainda aguardam resultados de testes
  • Esse número é maior do que os 241 óbitos confirmados pelo Ministério de Saúde no país inteiro até ontem
  • Se os testes confirmarem que essas pessoas foram vítimas do coronavírus, o número de óbitos oficiais pela covid-19 no país aumentaria em 122%
  • E pode ser só a ponta do iceberg. Órgão da prefeitura do Rio registrou 216 mortes que podem ter sido pelo coronavírus

Maior concentração de diagnósticos de covid-19 no Brasil, a região Sudeste tem 295 casos de mortes suspeitas pela doença que ainda aguardam resultados de testes. Esse número é maior do que os 241 óbitos confirmados pelo Ministério de Saúde no país inteiro até ontem. E a quantidade de vítimas suspeitas de terem o novo coronavírus pode ser ainda maior, segundo dados de funerárias e cemitérios do Rio de Janeiro e de São Paulo.

De acordo com o Ministério da Saúde, 81% dos óbitos por covid-19 no país (ou seja, 195 mortes) ocorreram na região Sudeste, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais — o Espírito Santo não teve vítima fatal.

A pasta não divulga o número de mortes suspeitas por coronavírus que ainda necessitam de testes. Isso porque depende das informações passadas pelas secretarias de saúde de cada estado, e nem todas têm esses dados discriminados, segundo pesquisa do UOL. Mas as secretarias do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Minas Gerais estão registrando as mortes que são suspeitas por coronavírus que ainda esperam exames.

"Tem em torno de 200 (mortos) esperando em São Paulo, aguardando a rodagem da testagem. Se será 5%, 1% de infectados, vai agregar no dia a dia. Quando tivermos esse passivo zerado, vamos ter a dinâmica [da doença]. São números que estamos monitorando muito de perto", afirmou ontem o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em entrevista coletiva.

"Muita gente pergunta: 'Esses óbitos não vão ficar sem investigação?'. Não vão ficar. Vamos investigar. O material foi coletado e está em análise", completou João Gabbardo, secretário-executivo do ministério.

Em São Paulo, o número divulgado ontem foi de 201 testes realizados em mortos que aguardam análise sobre o coronavírus; no Rio, foi de 49, e em Minas Gerais, 45. Ou seja, um total de 295 mortes suspeitas de terem ocorrido devido à doença covid-19. Se os testes confirmarem que essas pessoas foram vítimas do coronavírus, o número de óbitos oficiais pela covid-19 no país aumentaria em 122%.

"Nesse momento, é preciso acumular o maior número de dados para um possível controle do sistema [de saúde]. Se não tivermos uma boa notificação, não vamos traçar as melhores estratégias de prevenção", analisou o infectologista Edimilson Migowski, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Ponta do iceberg

Mas essa pode ser só a ponta do iceberg. A coordenadoria de cemitérios da prefeitura do Rio de Janeiro registrou 216 pessoas mortas que podem ter sido infectadas pelo coronavírus. O levantamento, feito a pedido do UOL, levou em consideração o que consta nos atestados de óbito encaminhados para os 21 cemitérios públicos e particulares do Rio de Janeiro. Segundo a prefeitura, foram feitas coletas para os exames a serem realizados pelos estados.

Desses registros, 174 constavam como casos prováveis de coronavírus e outros 42 apontavam causa indeterminada de morte, em decorrência de problemas respiratórios. Mas os números podem ser bem mais expressivos.

Na madrugada de terça-feira (31), uma idosa de 91 anos morreu com pneumonia e sepse pulmonar — cemitérios do Rio. Embora estivesse com sintomas compatíveis com um caso suspeito de coronavírus, o dado não foi incluído no atestado de óbito. Segundo parentes, não houve coleta para verificar se ela contraiu ou não o vírus. O mesmo ocorreu com uma senhora de 61 anos, vítima de uma infecção respiratória aguda na última sexta-feira (27).

Uma reportagem da Folha de S. Paulo mostrou quadro similar entre as funerárias de São Paulo: são entre 30 e 40 casos de mortos com suspeita de covid-19 por dia. Estão à espera de testes a serem realizados pelo Instituto Adolfo Lutz, que está sobrecarregado com exames.

"O que temos são dois fenômenos distintos. Uma é a subnotificação em si — casos de covid-19 leves que não entram nos registros. Mas, em cima disto, tem o atraso de notificação, que é devido ao represamento de exames, que ainda não foram analisados. Isso faz com que o fluxo de casos confirmados seja um reflexo sobretudo do represamento de exames, e não tanto da epidemia em si. Estamos em voo cego neste momento", analisou Roberto Kraenkel, físico da Unesp que trabalha no projeto "Observatório de COVID-19", projeto que reúne diversas universidades para acompanhar a progressão da doença.

Notícias