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Demissões e cortes de salário: como pandemia atingiu as empresas de ônibus

Divulgação
Imagem: Divulgação
do UOL

Daniel Leite

Colaboração para o UOL

27/03/2020 18h25

Cerca de 70 mil funcionários de empresas de ônibus rodoviários deverão ficar sem salários em abril, e as demissões avançam nas garagens. Empresários dizem que o fechamento de estradas têm feito as receitas caírem a zero. Enquanto algumas viações já realizaram dispensas, em outros caso os trabalhadores estão em férias coletivas.

A associação que representa os empresários diz que espera ajuda federal para capital de giro. Motoristas, cobradores, bilheteiros, funcionários de manutenção e da área administrativa têm feito várias demonstrações de apreensão em redes sociais, filmando os pátios cheios de ônibus parados e os momentos em que ocorreram as demissões.

Dentre as 10 maiores empresas do ramo, a Cometa, que pertence ao grupo JCA, é uma das que estão tomando providências drásticas.

Um funcionário de 62 anos, 14 deles na firma, conversou com a reportagem sem querer se identificar. Segundo ele, os empregados com 60 anos de idade ou mais estão em casa, em licença remunerada. Os que não são idosos foram dispensados do trabalho e não vão receber o próximo salário.

A torcida agora, diz o motorista da linha Campinas x Rio, é para a empresa conseguir cumprir com a promessa de tentar manter o tíquete alimentação e não cobrar pelo convênio médico.

"Não tivemos a confirmação disso ainda, estamos torcendo para que consigam fazer mais isso por nós. Todos, remunerados ou não, estamos ansiosos para que essa situação se normalize, tanto as medidas preventivas de fechar entrada e saída de determinadas cidades, e, principalmente, a pandemia", comentou.

Na garagem da Cometa em Juiz de Fora (MG), um trabalhador informou à reportagem que três funcionários foram demitidos. Como a empresa faz o transporte fretado para a fábrica de caminhões da Mercedes-Benz na cidade, num total de 27 viagens por dia, o número de dispensas não foi tão alto.

Mas, de acordo com os funcionários, a apreensão entre os rodoviários ainda é grande porque não sabem o que pode vir a acontecer. Segundo a fabricante alemã, parte dos trabalhos na planta mineira já foi paralisada nos últimos dias.

Nas redes sociais, há várias postagens de trabalhadores mandados embora em diferentes viações. Da Itapemirim, com sede no Espírito Santo, um trabalhador postou uma foto sua na garagem e dizendo ter sido demitido depois de seis anos na empresa. "Não é isso que o governo mandou. Diminuir salário, sim, demissão, não. Agora, em casa, com dois filhos pequenos, sem emprego, sem salário e sem poder sair de casa. A morte vai ser por depressão".

A Gontijo, que também figura entre as 10 maiores empresas do ramo, está com as garagens cheias, segundo postou um trabalhador. Um comunicado interno avisou os empregados ontem sobre uma "paralisação total", de acordo com o termo utilizado no aviso. "Para evitar demissões, a empresa vai dar férias a todos", alerta a firma.

O pagamento de até 30% das férias, de 30 dias, seria feito até hoje. O restante, e 30% do abono salarial, serão acertados até dezembro, afirma o comunicado. "Esta medida vale também para os funcionários que estão com férias programadas para o mês de abril. Sendo assim, vai ser antecipada. Vamos aproveitar este tempo, para ficarmos em família e pedir a Deus para que logo tudo volte ao normal", diz o aviso.

Empresários esperam linha de crédito

"Com a pandemia, as receitas caíram praticamente a zero", afirma o diretor da Associação das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiros. Segundo Flavio Maldonado, várias empresas já estavam em situação financeira delicada antes da crise. Com a chegada da pandemia, o problema se agravou.

Maldonado tem uma viação com 210 ônibus que circulam por oito estados. Segundo ele, há mais de uma semana que a empresa não recebe nada em caixa. "Perdemos totalmente a nossa capacidade de pagar até óleo diesel, e, principalmente, para o pagamento dos empregados".

A Anatrip estima que sete de cada 10 trabalhadores não vão receber salários em abril e as dispensas devem aumentar. "A gente estima que 70 mil não receberão em abril e a maioria deverá ser demitida nos próximos dias. Nós já estamos demitindo. Eu tenho 855 empregados, dispensei 700 e eu não sei quando vou conseguir pagar os salários e a rescisão, que é caríssima.

O diretor da associação dos empresários afirma que o ideal no momento é o governo federal liberar uma linha de crédito para capital de giro. O montante ainda não foi calculado porque, segundo Maldonado, a situação muda a cada dia, com mais demissões.

Ele diz que, como muitas passagens são vendidas via cartão de crédito, os bancos costumam antecipar o valor a ser repassado às empresas para receber depois. Mas com a insegurança sobre o futuro, esse tipo de negociação foi interrompida porque as instituições financeiras sabem que as viações não vão receber.

Por ano, cerca de 80 milhões de passageiros utilizam ônibus rodoviários no país em aproximadamente 18 mil veículos.

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