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Executivo brilha como drag-queen no carnaval e promove inclusão no mundo empresarial

19/02/2020 10h21

São Paulo, 19 Fev 2020 (AFP) - Embora viva em um país onde episódios de intolerância se tornaram cada vez mais comuns, Fernando Magrin, executivo da American Airlines, drag-queen e figura do carnaval de São Paulo, é um defensor convicto da inclusão no ambiente corporativo.

Alto e de olhos muito azuis, Magrin, de 55 anos, se veste de rosa da cabeça aos pés para encarnar sua alter ego "Mama". A personagem foi criada em 2016, para o bloco "MinhoQueens", que no último ano reuniu 200 mil pessoas no centro da maior cidade do país.

O nome do bloco foi escolhido assim por causa do trajeto pelo qual circula durante a temporada de carnaval e uma brincadeira de palavras: ele passa pelo Minhocão e se mescla com a palavra "queens" (rainhas, em inglês).

"Somos as rainhas do Minhocão", conta Magrin enquanto se maquia, também em tons bem chamativos de rosa, no seu apartamento no centro de São Paulo.

A popularidade do "MinhoQueens" também permitiu que ele tivesse mais visibilidade dentro da American Airlines, companhia aérea na qual trabalha há 24 anos.

Assim, "Mama" deixou de ser apenas um símbolo de diversão e se tornou um ícone a favor da inclusão e da diversidade no ambiente corporativo da capital econômica da América Latina.

"As empresas brasileiras não entraram nessa onda conservadora", afirma o executivo de vendas da companhia americana.

"O Brasil é aquela coisa, com os contrastes. A gente continua sendo o primeiro país do mundo que mais mata pessoas LGBT. É difícil, mas acho que está tendo uma abertura, principalmente no mundo corporativo", diz Magrin, que preside o recém-criado Comitê da Diversidade da sua empresa e é porta-voz em diversos eventos sobre o tema.

"Internacionalmente falando o mundo pede isso, e a gente está mais globalizado, estou falando de grandes corporações porque em pequenas empresas, a realidade pode ser outra", admite.

Mesmo assim, "algo está mudando, pode ser um interesse publicitário, mas acho que vem algo positivo disso depois. O resultado é bom porque o respeito começa a imperar", acrescenta o executivo.

- Medo -São Paulo é cenário da maior parada do Orgulho LGBT do mundo. O movimento, que começou em plena Ditadura Militar nos anos 1970, conquistou nas décadas seguintes a possibilidade de matrimônio, além das mudanças de sexo e de nome.

Após a eleição de Jair Bolsonaro, no entanto, a população LGBT ficou em estado de alerta. Ainda como deputado federal, o então presidente disse em entrevista: "Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí".

"Houve um medo generalizado no começo do ano passado, mas a gente viu que não era bem assim, que dava para (continuar na luta). Existe uma censura de várias coisas, mas a gente continua firme e forte", ressalta Magrin.

O executivo conta que, em 2019, foi convidado para participar de um maior número de eventos pela diversidade. Ele interpreta como um sinal de que a onda conservadora não impactou o mundo empresarial internamente.

- Preconceito presente -Magrin considera sua vida como "uma história com final feliz", por causa da sua boa relação familiar e do seu ambiente de trabalho inclusivo. Sabe, no entanto, que "não é a história de todo mundo".

"Diversidade é você dar uma festa e chamar todo mundo, a festa é diversa. A inclusão é chamar uma pessoa para dançar, e nisso acho que o mundo corporativo ainda peca", diz Magrin.

"Em alguns mercados muito mais conservadores ainda é difícil encontrar uma transexual" e, nas ruas, a situação é ainda de maior vulnerabilidade.

"Um homem mais feminino, uma lésbica mais masculina, são atacados. Os que permanecem nas ruas são os que mais importam na nossa luta, porque são os que estão levando os golpes para que todos tenhamos direito de estar nas ruas", ressalta.

Em seu pequeno escritório, em um bairro nobre da cidade, Magrin conta que o nome "Mama" surgiu de um filme, mas também devido à diferença de idade entre ele e os jovens nos blocos.

"Sou como uma mãe", explica rindo.

Em uma das suas primeiras festas na rua, durante a temporada de pré-carnaval, centenas de jovens foram ao evento mesmo com chuva. Um deles, Lucas Soares, de 23 anos, conversou com "Mama".

"É muito legal quando você vê que as pessoas que estão em um cargo acima de você estão na mesma linha que você. Ele veio falar comigo e me senti super acolhido", conta o executivo.

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