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Bolsonaro proibiu e mandou Exército, mas queimadas ainda castigam Amazônia

24.ago.2019 - Aviões da FAB foram usados no combate a queimadas na Amazônia - Divulgação/FAB
24.ago.2019 - Aviões da FAB foram usados no combate a queimadas na Amazônia Imagem: Divulgação/FAB
do UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

28/09/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Decreto de proibição e Exército não detiveram queimadas na Amazônia
  • Em setembro, já foram registrados 18.557 focos de incêndios até o dia 26
  • Apesar de queda, número ainda é expressivo no bioma

O presidente Jair Bolsonaro decretou GLOA (Garantia da Lei e da Ordem Ambiental) e enviou militares para combater o fogo que se alastrava pela Amazônia no último dia 23 de agosto. Cinco dias depois, publicou um decreto proibindo por 60 dias as queimadas na Amazônia.

De lá para cá, o número de incêndios caiu, mas ainda continua em níveis considerados altos para um bioma que não tem autocombustão --todo fogo na Amazônia é iniciado por ação humana.

Neste mês, já foram registrados 18.557 focos de incêndios até o dia 26, pouco menos que os 23.501 no mesmo período em 2018. O bioma não é mais líder em queimadas, posto ocupado agora pelo cerrado, com 22.498 focos.

O ano de 2019 registra até aqui 65.382 focos de incêndio na Amazônia. O número de queimadas, entretanto, vem caindo. O dia 22 registrou o menor número dos meses de agosto e setembro, com 167 focos, mas o número voltou a crescer, chegando a 336 no último dia 26.

Bolsonaro resolveu ampliar o prazo da operação Verde Brasil, que emprega as Forças Armadas na Amazônia. O decreto, inicialmente feito para durar 30 dias, foi estendido até 24 de outubro.

Segundo o Ministério da Defesa, nos 30 primeiros de operação foram utilizados 7.600 homens e mulheres. Outros 2.000 militares foram capacitados como brigadistas.

A ação usa 139 viaturas, 81 embarcações e 14 aeronaves. Até o fim de semana passado, a operação combateu mais de 500 focos de incêndios, com 112 termos de infração e R$ 36,3 milhões em multas aplicadas.

Quinze acampamentos e oito pontes clandestinas já foram destruídos. Embarcações, caminhões, tratores, escavadeiras, motosserras e motobombas também foram apreendidos.

Na segunda-feira, na Assembleia da ONU (Organização das Nações Unidas), Bolsonaro afirmou que, "nessa época do ano, o clima seco e os ventos favorecem queimadas espontâneas e criminosas". "Vale ressaltar que existem também queimadas praticadas por índios e populações locais, como parte de sua respectiva cultura e forma de sobrevivência", completou.

Queimadas - Felipe Werneck/Ibama - Felipe Werneck/Ibama
Imagem: Felipe Werneck/Ibama

Entretanto, todos os especialistas consultados pelo UOL negam que haja fogo espontâneo na Amazônia. Entidades classificaram a fala como "farsa".

Por que as medidas não foram eficientes?

Primeiro é preciso entender que as queimadas fazem parte da rotina da Amazônia há muitos anos. Além disso, o bioma é gigante e de difícil acesso.

"Foram oito meses até [Bolsonaro] tomar ações contra o desmatamento. Em agosto, [o governo] tentou correr atrás, mas não é tão simples. Devido ao tamanho do problema que se criou, o uso das forças federais foi importante e efetivo, mas é muito pouco para a gravidade", diz Rômulo Batista, do Greenpeace.

Para ele, muitas políticas de orientação, controle e combate ao desmatamento foram desfeitas pelo atual governo. "Nos últimos anos, houve aprimoramento de ferramentas tecnológicas e um uso dela favorecendo as ações de combate ao fogo. Mas o que a gente viu neste governo foi o contrário, com corte enorme na quantidade de dinheiro para o Ibama. Tivemos ainda o Ministério do Meio Ambiente questionando o Inpe [Instituto de Pesquisas Espaciais] quando ele apontou a alta nos alertas de desmatamento", afirma ele.

Está muito claro que estamos vivendo agora o fruto de não seguir o modelo que dava certo e de não implementar outro que funcione
Rômulo Batista, do Greenpeace

Sobre a ação das Forças Armadas, Batista afirma que elas são úteis, mas insuficientes. "Eles podem surtir efeitos nos pontos em que atuam —de forma mais efetiva em terras federais—, mas o problema é tão grande e se demorou tanto a agir que vai ser necessário um esforço hercúleo para cessar isso."

O ambientalista do Greenpeace ainda afirma que o decreto do presidente para proibir queimadas foi inócuo. "Um papel para proibir não serve de nada. A maioria não tem autorização para fazer fogo nenhum. São pessoas que desmataram ilegalmente. Mais de 66% dos focos de janeiro a agosto, ou eram em áreas desmatadas nos últimos dois anos, ou era em área de floresta", destaca.

Mariana Napolitano Ferreira, gerente de ciências do WWF, diz que as queimadas tiveram uma queda em setembro, apesar de ainda ocorrerem em "número elevado e preocupante".

Ela ressalta a influência da alta do desmatamento nos incêndios. "As queimadas estão associadas ao desmatamento. Neste ano, o desmatamento está 70% acima da média dos últimos três anos. A queimada é muito associada a esse processo, é o último estágio dele. Enquanto tiver esse ritmo, não vai haver uma redução drástica", afirma.

Ferreira explica que boa parte dos focos ocorre em áreas de difícil acesso, o que dificulta o combate ao fogo. "Entre detectar o fogo e chegar ao local, existe uma dificuldade. Como são muitos focos, não tem equipe para combatê-lo em todos lugares. Claro que as brigadas têm um papel fundamental para minimizar isso, mas o problema só vai ser resolvido aos poucos", diz.

Ela também diz acreditar que o decreto não teve efeito prático por serem queimadas ilegais. Mas destaca que a presença das Forças Armadas "inibiu as pessoas".

"Há um histórico neste ano de reduções de infrações e multas, o que gerou essa sensação de impunidade que não se combate da noite para o dia", diz. "É importante que não se limite a essa ação da GLOA, mas de debate do desenvolvimento que queremos para a Amazônia. O que a gente espera é que não se precise de uma nova GLOA em 2020", completa.

Procurado desde o dia 19, o Ministério do Meio Ambiente não respondeu ao pedido do UOL para que comentar as queimadas na Amazônia.

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