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Consumidor com consciência ambiental pressiona marcas de luxo

Robert Williams

20/08/2019 15h53

(Bloomberg) -- Toda primavera na Califórnia, com a maré alta e a lua cheia, cardumes de grunions saltam do mar para desovar na areia.

Em um final de tarde em junho, as praias foram invadidas por rapazes magros paramentados com a última coleção de Saint Laurent ? camisas de gaze, blazers cravejados de cristais e sapatos pontiagudos. Os modelos desfilaram a poucos metros das ondas em Paradise Cove, Malibu, diante dos olhares aprovadores de jornalistas, estilistas e celebridades.

Os peixes não apareceram e sua ausência provocou reclamações e revolta da população e das autoridades em Malibu. Na mira dos críticos está a Kering, dona da marca Saint Laurent. A empresa se posicionou como líder de um movimento para reduzir o impacto ambiental da indústria da moda, mas trouxe gente do mundo todo para o desfile em jatos, causando também a liberação de toneladas de dióxido de carbono.

As empresas de artigos de luxo andam por um campo minado. A feroz concorrência pela preferência dos consumidores e por atenção nas redes sociais força as marcas a produzir eventos cada vez mais chamativos. A disparada da demanda na China elevou a produção para níveis sem precedentes ? o que significa que as confecções estão usando mais recursos naturais do que nunca, incluindo couro, cashmere e metais. Ao mesmo tempo, o setor enfrenta maior pressão de consumidores e autoridades reguladoras para limitar o impacto ambiental de seu rápido crescimento e da cadeia de suprimentos altamente poluente e com pouca supervisão de fornecedores.

"Reguladores, consumidores e, cada vez mais, os investidores estão fazendo dos critérios socioambientais uma referência de alerta importante", disse Mario Ortelli, consultor do mercado de luxo em Londres.

O setor começa a acordar. Empresas de vestuário como Giorgio Armani e Versace interromperam o uso de materiais polêmicos, como peles. A Burberry Group prometeu recentemente parar de destruir estoques não vendidos ? prática disseminada da indústria da moda para evitar que produtos indesejados parem nas araras de descontos. Em julho, a gigante LVMH ? dona de Louis Vuitton, Christian Dior e Champagne Dom Perignon ? comprou uma participação na grife de Stella McCartney, conhecida por trabalhar com materiais sustentáveis, como solas de sapato biodegradáveis. A Prada pretende fabricar todos os seus icônicos acessórios de nylon usando materiais reciclados, incluindo resíduos que estão no oceano, até o final de 2021.

Na linha de frente está a Kering, que além da Saint Laurent é dona das marcas Gucci e Balenciaga. O presidente do conselho, François-Henri Pinault, tenta convencer outras empresas globais de moda a aderir a um novo pacto de sustentabilidade. O presidente francês, Emmanuel Macron, colocou o assunto na pauta da cúpula do Grupo dos Sete, que será realizada em Biarritz neste mês, escalando Pinault para liderar a iniciativa. O comandante da Kering tenta fazer com que as companhias do setor se comprometam com metas como a eliminação dos plásticos descartáveis e a aceleração da transição para energia renovável.

A Kering também pressiona sua rede de fornecedores e subfornecedores a esclarecer a procedência das matérias-primas, além de impor padrões mais rigorosos de eficiência energética e bem-estar animal. Desde 2010, os bônus pagos aos executivos da Kering são atrelados ao desempenho ambiental.

Consumidores frequentemente associam poluição e desperdício na indústria da moda a fabricantes de tênis e varejistas de vestuário de pouca durabilidade ? no caso dessas empresas, as cadeias de suprimentos incluem enormes fábricas que empregam mão de obra barata em países com baixa regulamentação. Agora as companhias de luxo estão na mira: clientes mais jovens procuram evitar produtos glamurosos de origem infeliz.

Millennials (nascidos a partir da década de 1980) e integrantes da Geração Z (nascidos a partir de meados da década de 1990) serão responsáveis por quatro quintos do crescimento do setor de luxo nos próximos anos, segundo relatório do analista Flavio Cereda publicado pela Jefferies em julho. Três quartos dos millennials afirmam que mudam seus hábitos de consumo diante de preocupações ambientais. No caso dos baby boomers (nascidos após a Segunda Guerra Mundial), a parcela é de 34%.

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