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França diminui período obrigatório de abstinência sexual para gays doarem sangue

17/07/2019 13h16

O período de abstinência sexual de um ano, que atualmente os homossexuais são obrigados a respeitar para poderem doar sangue na França será reduzido para 4 meses a partir de 1° de fevereiro de 2020, anunciou nesta quarta-feira (17) o ministério da Saúde do governo Macron.

A medida é "um primeiro passo" para o fim da discriminação das condições à doação de sangue por homossexuais. Segundo o governo, a igualdade total entre gays e héteros na hora de doar sangue está prevista para "até 2022". "Esta tendência é muito clara, mas passa por uma fase intermediária", disse o porta-voz do Ministério da Saúde da França, Jérôme Salomon, em entrevista coletiva.

A finalidade desta fase intermediária seria garantir que o fim das condições específicas aplicadas aos doadores homossexuais não aumentará o risco de contaminação durante as transfusões de sangue. "Nós atravessamos alguns anos sombrios com sangue contaminado" [descoberto, na França, entre as décadas de 1980 e 1990, o que causou muitas contaminações com o vírus da Aids após transfusões], enfatizou Solomon. "Daí a importância do princípio da precaução e do requisito de segurança para os pacientes", sublinhou.

A diminuição "substancial" do período de abstinência para a doação de homossexuais é "uma evolução que garante a segurança na transfusão de sangue", afirma um comunicado conjunto da Associação Francesa de Hemofilia (AFH) e a AIDES (Luta contra a AIDS e hepatite), dois órgãos de saúde extremamente afetados no passado pelo sangue contaminado.

Discriminação

A abstinência sexual de um ano para gays, introduzida por decreto em 2016, provocou críticas de associações homossexuais que assinalaram uma discriminação nesta obrigação. Antes de 2016 e desde 1983, a exclusão da doação de sangue a homens que fazem sexo com homens (HSH) era total, devido aos riscos na época relacionados à AIDS.

A ministra da Saúde, Agnès Buzyn, decidiu reduzir de 12 para 4 meses o prazo para doar sangue após a última relação sexual entre homens gays com base em uma avaliação científica de riscos. De fato, estudos da agência de saúde pública da França mostraram que a liberação da doação de sangue por homossexuais em julho 2016 não aumentou o risco residual de transmissão do vírus da Aids.

Desde então, o risco de transmissão por sangue contaminado é estimado em 6,3 milhões de doações, ou seja, uma doação positiva a cada 2 anos, seja de pessoas heterossexuais ou gays. "O risco continua em constante declínio e em níveis extremamente baixos", insistiu o Salomon, lembrando que a última contaminação com o vírus da Aids depois de uma transfusão ocorreu em 2002.

No Brasil, homens gays precisam esperar um ano para doar sangue

De acordo com a ONU, é necessário que 3 a 5% da população de um país seja doadora para se alcançar índices ideais de doação de sangue. Porém, apenas 1,6% dos brasileiros doa, segundo dados do Ministério da Saúde. No Brasil, homens homossexuais só podem fazer doação sanguínea após um ano sem manter relações sexuais com outro homem, o que impede que esse número aumente. Em entrevista ao site jurídico JusBrasil, a advogada especialista em Direito Homoafetivo e presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Maria Berenice Dias, confirma a dicotomia da portaria. "Há duas resoluções que entram em conflito", diz.

Para ela, além de paradoxal, a medida seria inconstitucional, por ferir o artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Em declarações ao site, Maria Berenice Dias  afirma que "a portaria é absolutamente discriminatória". "Qual é o motivo de essas pessoas não poderem doar? Não é por conta da orientação sexual, mas pelo fato de manterem relações anais. Não é a orientação sexual da pessoa que determina a prática do sexo anal, heterossexuais também praticam e deveriam ser incluídos", explica.

Respaldada por esses dois argumentos, a Comissão da OAB solicitou uma mudança do texto ao Ministério da Saúde do Brasil no fim de 2013, mas, de acordo com a advogada, nenhuma medida foi tomada nesse sentido até o momento. Países como Argentina, Chile e México, no entanto, aplicam as hoje as mesmas regras a doadores de qualquer orientação sexual.

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