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Fórum sugere texto contra lei de Moro que atenua pena de policial que mata

9.abr.2019 - O ministro Sergio Moro, da Justiça, em encontro com deputados do grupo de trabalho do projeto anticrime - Guilherme Mazieiro/UOL
9.abr.2019 - O ministro Sergio Moro, da Justiça, em encontro com deputados do grupo de trabalho do projeto anticrime Imagem: Guilherme Mazieiro/UOL
do UOL

Igor Mello

Do UOL, no Rio

26/04/2019 04h00

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) apresentou ontem à Câmara dos Deputados um relatório que sugere alterações no pacote anticrime proposto pelo ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública).

O texto é uma sugestão contra o ponto mais polêmico das medidas apresentadas pelo ex-juiz federal: a ampliação do excludente de ilicitude, isto é, a aplicação de penas mais brandas para policiais que matam em serviço.

De acordo com o projeto de Moro, em casos em que um policial é condenado por crimes como homicídio ou tentativa de homicídio, um juiz poderia reduzir pela metade ou até mesmo deixar de aplicar pena se "o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção".

A medida é criticada por especialistas e entidades de defesa dos direitos humanos, que a veem como um estímulo para o aumento da letalidade em ações policiais.

A proposta do fórum foi encomendada pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), coordenadora do grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para discutir o pacote.

Estados e União arcariam com defesa de policiais

O FBSP aconselha que os estados e a União - por meio das corporações policiais e das Forças Armadas - passem a custear a defesa de seus homens durante todo o período em que eles sejam investigados por mortes em confronto, e não apenas quando eles viram réus na Justiça.

Com base em dados fornecidos pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Fórum estima que a defesa desses policiais teria custado cerca de R$ 23 milhões em 2018, caso a regra estivesse em vigor.

Hoje, os próprios policiais acusados precisam arcar com os gastos durante a fase de inquéritos, o que pode levar anos. Essa despesa própria dos oficiais é um dos principais argumentos das corporações para defender o excludente.

Segundo Renato Sérgio de Lima, presidente do FBSP, essa modalidade de financiamento público das despesas jurídicas já existe na Bahia, através de um convênio com a Defensoria Pública do estado, e no Maranhão, onde são os procuradores do estado os responsáveis pela defesa dos policiais.

Não faz sentido onerar o policial e deixar o estado continuar omisso nessa questão. A proposta tenta responder a uma demanda da sociedade por transparência e contemplar uma reclamação legítima dos policiais
Segundo Renato Sérgio de Lima, presidente do FBSP

Lima crê que o fato de os custos com as defesas saírem diretamente dos orçamentos das polícias irá propiciar uma postura mais transparente na classificação dessas mortes.

"Vamos induzir que esses casos tenham registros corretos. As mortes legítimas serão tratadas como legítimas e os abusos serão tratados como abusos. A ideia é resolver o problema que existe de fato, e não dar um tratamento ideológico que estimule a violência", completa.

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Mais transparência em investigações e balanços

A emenda do fórum também prevê mecanismos de transparência para os inquéritos de mortes em confronto com a polícia. Estabelece que esses procedimentos sejam públicos, resguardando a possibilidade de restringir acesso "estritamente aos atos de investigação para os quais o sigilo for necessário à elucidação do fato".

Hoje, estados como o Rio de Janeiro - que tem o maior número de mortes por intervenção policial do país - consideram que até mesmo os registros de ocorrência desses casos são sigilosos.

O projeto também obriga as corporações a fazerem balanços anuais detalhados sobre os casos de policiais que receberam assistência jurídica e a disponibilizarem publicamente, quando solicitado, esses procedimentos, excluindo apenas os documentos considerados sigilosos durante as investigações.

Articulação contra texto de Moro

Fontes ouvidas pelo UOL afirmam que pelo menos quatro dos nove deputados que compõem o grupo de trabalho querem usar a proposta do FBSP como uma emenda substitutiva ao projeto de Sergio Moro, retirando a ampliação da exclusão de ilicitude. Compõem o grupo, além de Margarete:

  • Fábio Trad (PSD-MS)
  • João Campos (PRB-GO)
  • Marcelo Freixo (PSOL-RJ)
  • Orlando Silva (PCdoB-SP)
  • Subtenente Gonzaga (PDT-MG)
  • Lafayette de Andrada (PRB-MG)
  • Hildo Rocha (MDB-MA)
  • Capitão Augusto (PR-SP), relator do projeto

A deputada Margarete Coelho afirma que as medidas propostas pelo FBSP garantem melhores condições de serviço aos policiais, mas evitou se posicionar sobre a possível substituição do texto de Moro. Segundo ela, ainda é o momento de colher contribuições para só depois decidir o que fica e o que sai do projeto.

"O objetivo dessa medida é trazer mais garantias para os policiais. Vamos continuar debatendo bastante", afirmou ao UOL. "No grupo estamos bem divididos. Uma parte quer manter (a exclusão de ilicitude), outra acha que é uma licença para matar".

O grupo de trabalho tem a função de fazer uma análise comparada do projeto anticrime de Moro e das medidas propostas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o governo Michel Temer (MDB). Os parlamentares têm até 90 dias para formular um relatório que servirá como base para a discussão em uma comissão especial.

O FBSP reúne especialistas e profissionais da área de todo o país e organiza, em conjunto com o Ipea, o Atlas da Violência. A edição de 2018 do estudo foi adotada como parâmetro oficial pelo Ministério da Justiça para o cálculo das taxas de homicídio citadas no decreto que flexibilizou a posse de armas no país em janeiro.

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