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Dinheiro seguro: entenda por que Google e Apple decidiram apostar nos games

Apple Arcade é aposta da empresa da maçã no mundo dos games - Divulgação
Apple Arcade é aposta da empresa da maçã no mundo dos games Imagem: Divulgação
do UOL

Rodrigo Lara

Colaboração para o UOL, em São Paulo

29/03/2019 04h00

Google e Apple resolveram entrar para valer na indústria de games com anúncios quase simultâneos: em 19 de março, o Google apresentou o Stadia, sua plataforma de streaming, uma espécie de "Netflix de jogos". Seis dias depois, foi a vez de a Apple revelar o Arcade, seu serviço de games. Apesar de terem concepções distintas - enquanto o Stadia será totalmente baseado em streaming, o Arcade poderá funcionar offline -, as novidades marcam um investimento sem precedentes na área de games, vindo de duas das principais empresas de tecnologia do mundo.

Esse interesse, porém, não é tão súbito assim. Ambas as empresas já capitalizavam - e muito - com os games em suas plataformas de vendas de apps para celulares. Uma estimativa publicada pela consultoria Newzoo em setembro de 2018 indica que os games seriam responsáveis por 76% do total de faturamento oriundo de aplicativos de celular. Pouco tempo depois, em um relatório de balanço de 2018, a consultoria apontou que jogos para dispositivos móveis faturaram US$ 63,2 bilhões, uma participação de 47% no faturamento total da indústria de games.

Trata-se de uma indústria de mais de US$ 135 bilhões e que, em 2017, quando faturou US$ 116 bilhões, já havia ultrapassado a indústria relacionada às produções para TV por uma margem considerável, ocupando o posto de maior segmento do ramo de entretenimento mundial.

Ou seja, uma das razões para Google e Apple darem passos mais contundentes na indústria de games é o mais óbvio possível: dinheiro.

Uma aposta mais segura

Google e Apple também entram nesse mercado por um caminho menos arriscado, já que tanto Stadia quanto Arcade compartilham uma característica: a ausência de um hardware dedicado.

Durante a apresentação do Google, Majd Bakar, chefe de engenharia do Stadia, deixou claro: "Nós construímos a arquitetura do Stadia sobre a rede de dados do Google". Já o Arcade depende de dispositivos Apple para ser usado. Ainda que ambos os serviços, obviamente, tenham demandado um investimento considerável para serem lançados, o formato é mais seguro do que seria caso Google e Apple lançassem um console aos moldes de PlayStation, Switch ou Xbox.

Esse caminho também se apoia em exemplos prévios da indústria. Empresas como EA, Microsoft e Sony ganham seus milhões com suas abordagens do conceito de "games como serviço". Segundo a consultoria Superdata, os três serviços faturaram US$ 273 milhões apenas no terceiro trimestre de 2018.

A ausência da necessidade de hardware também derruba algumas barreiras e abre uma outra possibilidade: a de atrair pessoas que não estão dispostas a comprar um videogame ou, ainda, montar um PC para jogar. Vale lembrar que, no caso do Stadia, o controle específico do console é opcional para quem pretende jogar via PC ou smartphone, por exemplo.

Perspectivas positivas

O movimento de Google e Apple em direção aos games tem, sem dúvida, um viés de "ataque".

Explica-se: 2018 marcou a primeira vez na história o mercado de smartphones apresentou queda de vendas em uma comparação ano a ano. Segundo a consultoria Counterpoint Research, a retração do mercado foi de 4% em relação a 2017. Ainda nesta análise, a Apple não apenas teve um declínio de 4% nas vendas como viu o crescimento da chinesa Huawei - no relatório em questão, ambas aparecem com 14% de participação no mercado, mas a Huawei já havia superado a fabricante norte-americana em 2018.

É possível encarar essa retração como algo isolado ou sazonal, já que smartphones estão cada vez mais caros e, ainda que sejam lançados anualmente, o ritmo de evolução ano a ano não é exatamente alto. Mesmo assim, como diz o ditado, seguro morreu de velho. Marcar presença em um novo mercado quando a sua principal fonte de renda - os iPhone, no caso, que renderam 15% a menos para a Apple no primeiro trimestre do ano fiscal de 2019 em comparação ao mesmo período do ano passado - é uma maneira de diversificar investimentos e se trata de uma manobra clássica de marketing.

Isso se torna ainda mais claro se considerarmos o retrospecto e a perspectiva do mercado de games, que tem crescido em um ritmo de dois dígitos no últimos anos e parece longe de perder fôlego nesse sentido.

Nova tendência?

Quando Google e Apple apresentaram suas novidades, muito se disse que Stadia e Arcade têm potencial para, com o perdão do trocadilho, "mudar o jogo". Para isso as empresas não trazem apenas suas propostas inovadoras, mas também recorrem a estratégias conhecidas do mercado: o Google contratou veteranos da indústria, a Apple anunciou nomes como Hironobu Sakaguchi (de títulos como "Final Fantasy", "Blue Dragon" e "Chrono Trigger"), e Will Wright, de "SimCity" e "The Sims") em suas parcerias, e jogos exclusivos, como Sonic Racing (Arcade) devem aparecer cada vez mais.

Mas, na realidade, é pouco provável que as duas empresas mudem totalmente a cara da indústria de games no curto prazo. Ainda que haja um crescimento claro nas vendas de games por vias digitais (alta de 14% em 2018, segundo a Newzoo), jogar via streaming é um passo bem diferente.

Isso vale, especialmente, para jogadores mais assíduos, os chamados "hardcore" - uma das grandes preocupações em relação ao Stadia é o "input lag", ou a demora entre o jogador dar um comando e ele ser representado na tela de jogo. Em testes feitos em "condições ideais", o Digital Foundry chegou a resultados próximos dos obtidos em PCs e no Xbox One X.

Por ora, é impossível analisar resultados do tipo no "mundo real", mas caso eles sejam ruins, a tendência é que afastem jogadores mais assíduos - em especial os fãs de jogos de luta ou outros games que exijam reflexos rápidos.

Já no caso do Arcade, a exigência em ter um aparelho Apple para rodar os jogos limita um bocado de sua potencial abrangência. Mesmo com esse detalhe, é impossível desconsiderar a parcela do mercado que tem algum produto da empresa.

De qualquer maneira, Stadia e Arcade parecem ter um potencial enorme para facilitar o acesso aos games para mais pessoas. Neste ponto, o que parece é que as duas plataformas chegarão para inflar o já promissor mercado de jogos e não para transformá-lo.

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