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Por que mata-mata pode acabar com a '"mina de ouro" que é o Brasileirão

Bruna Prado/Getty Images
Imagem: Bruna Prado/Getty Images
do UOL

Gabriel Vaquer

Colaboração para o UOL, de Aracaju

27/03/2020 12h43

A possibilidade de o Campeonato Brasileiro ser adaptado ao sistema de mata-mata ao invés dos tradicionais pontos corridos em vigor desde 2003, em razão do impasse de calendário gerado pela crise do coronavírus, pode acabar com a 'mina de ouro' que é a primeira divisão nacional e ajudar a fazer com que a situação financeira dos clubes se agrave. Tudo isso por conta do pagamento alto feito pelas empresas que compram os direitos de transmissão - no caso, Globo e Turner.

Números levantados pelo UOL Esporte apontam que, juntos, as duas empresas pagam um valor na casa de R$ 1.2 bilhão de reais para os clubes que disputam a competição, que entregam ao todo 380 partidas. Passando para o formato antigo de mata-mata, apenas 19 partidas ficariam com "pontos corridos" e com apenas dois clubes jogando no máximo 25 partidas. Seriam 204 partidas ao todo, neste modelo.

É mais de um terço da competição jogada fora, em termos de calendário para a TV, e que pode representar uma perda de ganho na casa dos R$ 600 milhões, se o módulo de pagamento como ele é representado hoje for seguido à risca neste formato. É uma queda acima de 50%, se formos falar em valores absolutos. Falamos em absolutos, porque o grosso deste dinheiro vem do Premiere, o serviço do pay-per-view da Globo.

Somente no ano passado, a emissora carioca pagou em torno de R$ 550 milhões pelos direitos de transmissão no Premiere, 100 milhões a menos que a previsão inicial, que era de R$ 650 milhões. O valor inicial não foi atingido devido aos problemas que passa o Brasil na economia nos últimos anos, segundo a Globo. Os clubes já esperavam uma arrecadação menor também.

Neste ano, a previsão é que este valor chegasse na casa dos R$ 700 milhões, sendo repartidos pelo cadastro de assinantes informando o clube que torce no ato da assinatura - no entanto, este valor era previsto sem a pandemia do Covid-19 e a incerteza sobre o calendário. A exceção é para clubes como Flamengo, Palmeiras e Corinthians, que tem um mínimo garantido pela emissora independente de quanto vendam de pacotes de pay-per-view.

Mas até isto está em risco os privilegiados do bolo. O UOL Esporte apurou que o contrato da Globo com os clubes prevê que uma mudança no regulamento dá o direito à Globo de renegociar este contrato do mínimo garantido por um valor menor e proporcional ao número de jogos que estes clubes disputem. Ou seja, se o Corinthians jogasse apenas 19 vezes, a emissora poderia argumentar que só pagaria o mínimo garantido referente a este número de partidas.

Atualmente, clubes que estão em dificuldades financeiras dependem muito do dinheiro da TV para sobreviver. Alguns deles adiantaram cotas de transmissão pelos próximos anos. É o caso, por exemplo, do Cruzeiro, recém rebaixado para a Série B, e do Botafogo, clube que está atolado em uma dívida no montante de R$ 760 milhões.

Só com TV aberta e paga no ano passado, o Alvinegro faturou R$ 51 milhões, que foram usados integralmente para pagar dívidas trabalhistas obrigatórias e manutenção do futebol. Quem mais faturou foi o Flamengo, que recebeu um valor próximo, contando todas mídias, na casa dos R$ 200 milhões - ou seja, um terço do que o Brasileirão iria perder se fosse para o mata-mata.

Nos bastidores, diretores de Globo e Turner são contra uma mudança de formato. Ambos têm o mesmo entendimento: o calendário brasileiro precisa se adaptar ao Brasileirão, principal fonte de renda dos clubes e que mantém eles vivos na atual conjuntura. Procurada oficialmente, a Turner não comenta a situação.

Em contato com a reportagem, a Globo afirmou que as incertezas em relação ao futuro do futebol brasileiro em 2020 transformam projeções nesse momento em especulações.

"Qualquer projeção neste momento é puramente especulativa, até porque não há decisões definitivas sobre o calendário do futebol deste ano. Com afirmamos na nota anterior, entendemos que, no momento, as prioridades são a saúde e a segurança de todos; e questões relacionadas ao futebol serão tratadas com calma e responsabilidade, após o fim da pandemia", diz o comunicado enviado pelo departamento de comunicação da emissora.

"No caso dos projetos comerciais, tendo em vista nossa histórica relação de respeito com os patrocinadores, tão logo os calendários sejam definidos, avaliaremos o melhor caminho para todos", completa a nota.

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