Topo
Esporte

Sem clube, Enderson vai à Europa para estudar e assistir a treinos e jogos

Enderson Moreira ao lado de Juninho Pernambucano, Caçapa e Francis Melo (seu agente) - Divulgação/Francis Melo Assessoria de Imprensa
Enderson Moreira ao lado de Juninho Pernambucano, Caçapa e Francis Melo (seu agente) Imagem: Divulgação/Francis Melo Assessoria de Imprensa
do UOL

Thiago Fernandes

Do UOL, em Belo Horizonte

13/11/2019 18h45

Após anos com a efetividade das formações nacionais questionadas, o futebol brasileiro ganhou, em 2019, duas novas e representativas caras, no que se refere ao comando técnico das nossas equipes: Jorge Sampaoli e Jorge Jesus. Experientes, ambos os treinadores desembarcaram no país do futebol com suas respectivas filosofias de trabalho e, apesar das dificuldades, vêm desempenhando bons trabalhos e se dando bem no Brasil.

Com desempenhos, até aqui, muito elogiados, Sampaoli e Jesus trouxeram consigo bagagens europeias, ou seja, experiências em locais considerados, na atualidade, os mais evoluídos do mundo no futebol. Por isso, tanto cobra-se, hoje em dia, que os treinadores brasileiros busquem se especializar, ainda mais, também no Velho Continente, prática que vem ganhando força mesmo dentre aqueles que já vem desempenhando bons trabalhos na beirada do campo, como é o caso de Enderson Moreira. Nos últimos anos, ninguém menos que Luiz Felipe Scolari, Muricy Ramalho e Tite se renderam e destacaram, espontaneamente, o desempenho tático das equipes de Enderson.

Ainda estudando propostas para 2020, Enderson resolveu tirar alguns dias e viajar por França, Inglaterra e Portugal, a fim de observar, in loco, o mercado e conceitos táticos que podem servir para a evolução de sua ideia de jogo. Ao longo de sua jornada, que durou 14 dias, o comandante passou por três países e analisou o jogo de equipes tops do futebol mundial, dentre elas, PSG, Lyon, Chelsea, Ajax, Liverpool e Manchester City, além de ter visitado os centros de treinamento de alguns desses e do Benfica, de Portugal. Confira abaixo as observações do professor nesse tour.

Premier League | Desvendando o jogo do Liverpool, clube que está garantido no Mundial de Clubes de 2019

Um detalhe muito interessante em termos táticos, que dá para você prestar muito mais atenção estando no estádio, é que a equipe do Liverpool se defende muito bem, sempre muito compactada, tendo, de alguma forma, quase um "pacto" entre os atletas. Em algumas situações, eles praticamente defendem com sete atletas, sendo a primeira linha de quatro mais os três homens de meio-campo. Os três (jogadores) de frente também ajudam, participam do processo defensivo, mas com uma responsabilidade bem menor. Estrategicamente, isso é muito bem pensado pelo (Jürgen) Klopp, porque esses jogadores ficam em posições privilegiadas do campo, de forma que, ao retomar a posse de bola, eles estejam em situações muito favoráveis para puxar o contra-ataque. É uma equipe preparada para defender com sete, dando uma certa tranquilidade e poupando o Firmino, o Mane e o Salah. E, quando eles roubam essa bola, têm uma possibilidade enorme de acionar esses atletas, o que, com certeza, pode trazer muitos problemas aos adversários.

The Champions! | O empate espetacular em 4 a 4 entre Chelsea e Ajax, a escola holandesa e a evolução dos zagueiros

Algumas outras coisas foram muito bacanas e também ficaram muito mais evidentes com a observação presencial, e uma delas foi a eficiência na recomposição defensiva. Todas as equipes tem uma preocupação enorme em recompor as linhas rapidamente, independentemente de qualquer situação que possa estar se desenhando no ataque. Isso faz com que as equipes possam estar sempre bem agrupadas, que é uma questão que dificulta o adversário a ter facilidade numa situação de transição, de contra-ataque. Outra coisa que acho muito importante ressaltar, e que é também uma tendência, é a questão da "marcação pressão" na saída de bola do adversário, que independe da equipe estar ganhando ou perdendo. Eles não mudam o comportamento. As equipes tem essa ideia de marcar em cima, até para que não favoreça o processo de posse de bola do oponente. Há, inclusive, variações de como marcar essa saída de bola do adversário. Então, é uma briga constante pela posse, porque todo mundo quer ter a bola sob seu controle. Tradicionalmente, a escola holandesa prima por isso, por ter a bola, envolver o adversário, controlar e propor o jogo, tomando as ações, e, hoje, não é diferente. E é algo que está diretamente relacionado a outro fator que se destaca muito nos times europeus. Não chega a ser novidade no Brasil o jogo dos goleiros com os pés, mas o que chama a atenção na Europa, de maneira geral, é a ótima qualidade dos zagueiros. Eles se transformaram em jogadores muito hábeis, tecnicamente muito capazes. Usam muito as duas pernas, têm giros com a bola para os dois lados, avançam terreno, conseguem executar o que eu chamo de "dribles de segurança", que são dribles de pouco risco, apenas tirando o oponente de um possível confronto. No próprio futebol inglês, a gente vê isso no City, por exemplo, com o Fernandinho, um volante, que em seu início de carreira foi meia, e que começa, agora, uma nova etapa como zagueiro, jogando com qualidade e propriedade. É um baita jogador, muito completo, e o futebol, hoje, exige isso.

No país campeão do mundo | Dois centroavantes e uma ideia bem definida na França: o professor acompanhou Dijon 1 x 0 PSG e Toulouse 2 x 3 Lyon

Notei uma situação, de certa forma, diferente também, que é o fato de muitas equipes francesas jogarem com dois centroavantes, algo pouco comum, hoje, no Brasil. Mas eu achei muito interessante, porque eles têm uma ideia muito clara, com relação à isso. Por terem uma grande quantidade de jogadores com essa característica de força, fazem um 4-4-2 bem característico, iniciando as partidas com dois centroavantes em muitas situações.

O intercâmbio | O valor da oportunidade de observar além do horizonte

Eu acredito muito que o profissional do futebol tenha que estar sempre de olho em tudo que está acontecendo, seja no Brasil ou fora dele. Muitas vezes, não temos a chance de rodar e observar, in loco, as grandes partidas, então, se temos, agora, a possibilidade esse é o momento de aproveitar e tirar o máximo possível dessas experiências. Francamente, vejo que temos muitas coisas boas no Brasil. Jogadores fortes, criativos, mas, há muito, o futebol é bem mais do que isso. Acredito que estejamos passando por processo interessante de evolução, e esse intercâmbio é importante.

O respeito e o cuidado | Como a instituição é vista e como o jogador e seus familiares são tratados nos grandes eventos

Um detalhe que acho fundamental falar, que tem a ver com uma questão cultural, é o respeito à instituição acima de tudo. Na Europa, ela está à frente de qualquer pessoa, seja jogador, treinador ou presidente. O clube é soberano! Ao mesmo tempo, vi, de forma muito evidente, que os profissionais também são bastante respeitados. Então, por mais que os torcedores tenham suas frustrações durante os jogos, entendo que há muito mais equilíbrio com a questão do ganhar ou do perder, o que faz diferença no desempenho dentro de campo. Acompanhei Chelsea e Ajax direto do estádio e, em determinado momento, o Chelsea perdia por 4 a 1, em casa, e a gente não percebeu alteração emocional no torcedor, no que se refere a vaiar ou hostilizar os jogadores e a comissão técnica. Na verdade, havia uma certa decepção, claro, mas houve incentivo, e acho que isso passou para o campo, porque o time reagiu, empatou e, por pouco, não virou a partida. Esse foi um ponto que me chamou a atenção positivamente. O respeito com o qual o atleta é tratado aqui é muito importante neste ciclo. O jogador se preocupa única e exclusivamente em jogar futebol. O clube tem mecanismos para facilitar a vida do seu jogador, não de forma protecionista, mas de modo que o profissional possa ficar tranquilo com seus familiares no dia do jogo, por exemplo. Há toda uma logística para que o atleta esteja extremamente seguro que seus familiares e amigos terão acesso a um local especial, o que faz com que os atores principais do jogo possam pensar apenas na partida.

Veja abaixo a lista de jogos e CTs que Enderson esteve:
01/11 - Dijon 2 x 1 PSG (Ligue 1)
02/11 - Toulouse 2 x 3 Lyon (Ligue 1)
04/11 - Visita ao CT Lyon
05/11 - Chelsea 4 x 4 Ajax (Champions League)
07/11 - Visita ao CT Chelsea
10/11 - Liverpool 3 x 1 Manchester City (Premier League)
12/11 - Visita ao CT Benfica

Esporte